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Petrobras restringe acesso às licitações, por Julia Mota e Ana Clara Chicrala

Julia Mota e Ana Clara Chicrala
20/08/2021 17:26
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Apesar da pandemia de coronavírus, o Brasil atingiu a média de 2,94 milhões de barris de petróleo por dia (Mb/d) em 2020, representando um aumento de 5,5% em relação a 2019. Com essa produção, o país superou o terceiro maior produtor de petróleo da OPEP, os Emirados Árabes Unidos, com 2,77 Mb/d.

DivulgaçãoA Petrobras, líder mundial em tecnologia de exploração de petróleo em águas ultraprofundas, somente em 2020, efetuou R$ 110 bi em transações através do seu portal de compras Petronect. Foram 160 mil licitações (fonte: petronect.com.br).

Através do Petronect, a empresa seleciona seus fornecedores através de um processo de cadastro com requisitos financeiros, legais, técnicos, de SMS e de integridade.

Refletimos anteriormente sobre o Grau de Risco de Integridade (GRI) e a sua nebulosa forma de avaliação, o que impede diversas empresas de participarem de licitações.

Recentemente esse requisito tornou-se o pesadelo dos fornecedores, já que de forma surpreendente, em qualquer momento da licitação, a comissão de licitação pode anunciar que o fornecedor está desclassificado, em função de nota alta (vermelha) no critério GRI, sem qualquer justificativa, mesmo após já ter sido declarado vencedor.

Isso porque a Petrobras alega que o departamento Due Diligence de Integridade (DDI) é independente e que suas análises são feitas de forma neutra, sem qualquer influência de outros departamentos da empresa. Assim, mesmo que uma determinada área da empresa tenha interesse em contratar o fornecedor, caso ele tenha sido taxado de “alto risco”, a contratação não pode ocorrer.

O que causa estranheza é o fato de que por vezes o fornecedor que recebe uma nota alta possui contrato em curso com a Petrobras, restando evidente que não há nenhum fato ou conduta que, ao menos no presente, possa conduzir a qualquer sanção ou penalidade.

Divulgação

Afigura-se que os parâmetros de avaliação do Critério de Integridade estão cada vez mais complexos e diversificados, exigindo uma atenção redobrada dos fornecedores, para evitar surpresas durante o procedimento licitatório.

Trata-se de procedimento realizado por meio de preenchimento de questionário de due diligence (auditoria) de integridade, realização de pesquisas a fontes abertas, e, por fim, a avaliação do Grau do Risco de Integridade - GRI. Os fatores de risco são avaliados em relação aos seguintes pontos: perfil da empresa; relacionamento com o poder público; histórico e reputação e mecanismos de prevenção, detecção e correção de irregularidades e atos de corrupção.

Os critérios acima estão de acordo com o previsto no art. 42 do Decreto 8420/15, Portaria CGU 909/15, a Portaria Interministerial 2.279/15, o “Programa de Integridade: Diretrizes para Empresas Privadas” da CGU e demais orientações nacionais e internacionais.

A Petrobras exige, com o mesmo rigor, que os seus contratados e seus fornecedores tenham o comprometimento da alta direção, incluídos os conselhos, evidenciado pelo apoio visível e inequívoco ao programa de integridade conforme prevê o decreto acima referido.

Além disso, conforme o art. 42 do Decreto 8420/15 a empresa deve ter padrões de conduta, código de ética, políticas e procedimentos de integridade, aplicáveis a todos os empregados e administradores, independentemente de cargo ou função exercidos assim como estendidas, quando necessário, a terceiros, tais como, fornecedores, prestadores de serviço, agentes intermediários e associados além de canais de denúncia de irregularidades, abertos e amplamente divulgados a funcionários e terceiros, e de mecanismos destinados à proteção de denunciantes de boa-fé, entre outras exigências previstas na legislação.

Revista TN Petróleo

No entanto, ainda que tais critérios sejam atendidos pelas empresas, pouco se sabe da efetiva valoração destes itens que geram ao final a nota no critério integridade. Um fato ocorrido há 10 anos atrás, por exemplo, pode ensejar uma nota vermelha, mesmo que contra a empresa não exista nada desabonador. Ou poderá se questionar como se comprovaria o comprometimento da alta direção. Há uma sensível subjetividade que traz insegurança jurídica para as empresas que participam das licitações.

O critério de seleção tem respaldo na Lei das Estatais (nº 13.303/2016), que dispõe que deve ser observada a política de integridade nas transações com partes interessadas (art. 32, inc. V). No entanto, apesar de poucas decisões ainda sobre a matéria, alguns tribunais têm decidido contra a atribuição de grau de risco de integridade alto sem fundamentação, devido ao cerceamento à ampla defesa e ao contraditório. Considera-se que a licitante deve ter ciência da motivação que embasou sua desclassificação, e assegurado minimamente e ainda na esfera administrativa a oportunidade para que possa contraditar a decisão da Petrobras.

Nesse sentido, o Tribunal de Contas da União (TCU) também vem se manifestando contrariamente a desclassificações injustificadas, fundamentadas apenas pelo grau alto de GRI, indicando a necessidade de exposição dos fatores que fundamentam as notas atribuídas, a partir dos critérios utilizados nas análises empreendidas.

A Petrobras tem a prerrogativa de vedar o acesso às licitações aos fornecedores que tem problemas relacionados a desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos, e assegurar a seleção da proposta mais vantajosa para a empresa. No entanto, assim como outras estatais, deve respeitar princípios constitucionais, como o art. 37, inc. XXI, da Constituição Federal, que estabelece que somente são permitidas exigências de qualificação indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações objeto do contrato, e o art. 5, inc. LV, que resguarda o direito à ampla defesa e ao contraditório, garantia fundamental condizente com uma sociedade democrática.

Sobre as autoras: Julia Mota é sócia fundadora do Mota Advogados e Ana Clara Chicrala é associada Mota Advogados

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