Jornal do Commercio
A combinação de euforia com um mercado inexistente para o etanol, a busca de financiamentos de curto prazo, a falta de gestão profissional e um endividamento médio de 263% sobre os ativos trouxeram a crise ao setor sucroalcooleiro. A avaliação é do professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA/USP) Alberto Borges Matias, segundo o qual a crise das usinas estouraria mesmo se não houvesse a restrição mundial à liquidez.
“Em 2007, o nível de endividamento médio do setor era de 263%, com algumas empresas do setor sucroalcooleiro em 1.200%, contra uma média da indústria brasileira de 100% e norte-americana de 150%”, disse Matias. “Então a explosão dessa crise já era esperada e só foi revelada com a crise de liquidez do final do ano passado”, completou o professor.
De acordo com Matias, o problema do setor sucroalcooleiro é, portanto, estrutural e não tem relação com a restrição ao crédito ocorrida a partir do terceiro trimestre de 2008. “É inacreditável como a euforia levou tanta gente a se endividar no curto prazo para que houvesse essa expansão. Ou seja, a crise iria ocorrer de qualquer jeito”, explicou o professor durante o seminário “Cenários para a Safra Sucroenergética 2009/2010″, em Sertãozinho (SP).
Matias avalia que diante do cenário de insolvência de várias companhias sucroalcooleiras será necessária uma interferência ainda maior do Estado, com a aquisição de participações acionárias dessas empresas, por exemplo, pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
“É natural que as tradicionais famílias percam ainda mais o controle e que haja também a entrada de credores nas empresas, bem como um alongamento do perfil dessas dívidas”, avaliou o professor, que ressalta: “Os fundamentos seguem muito bons para o setor, com cenário de alta demanda para açúcar e o álcool”, concluiu.
Oriundo de uma das mais tradicionais famílias de usineiros, Maurílio Biagi Filho, admite que o setor não tem problemas de demanda para comercializar açúcar e álcool e que os dois produtos não terão ofertas altas este ano. Biagi ressalta que o mercado de açúcar internacional deve dar sustentação aos preços e que os empresários brasileiros, que exportam 40% da commodity negociada no planeta, serão beneficiados.
O empresário, porém, foi contra os que pregam o livre comércio e voltou a defender a centralização da comercialização do álcool em uma empresa mantida pelas mais de 400 unidades sucroalcooleiras. A prática seria semelhante à feita pela Brasil Álcool, criada no início da década justamente para reduzir a oferta do combustível e, assim, ter um preço melhor durante a safra, quando muitas destilarias descapitalizadas ampliam as vendas. A Brasil Álcool acabou após as investigações de prática de cartel. “Essa concentração das vendas teria de ser feita de uma forma diferente, que não configurasse cartel”, disse Biagi.
Para o consultor Luiz Carlos Corrêa Carvalho, uma opção para resolver as grandes variações de preços do álcool seria a ampliação de operações de hedge e a criação de novos contratos para o combustível que possam dar mais liquidez ao setor. “Esse assunto já vem sendo discutido há muito tempo e nunca há um consenso dentro do setor”, afirmou Carvalho.
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