Valor Econômico
O acordo entre brasileiros e bolivianos na questão da exploração do petróleo e do gás poderá passar por uma sociedade entre a Petrobras e a Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB), com a estatal do país vizinho majoritária no negócio. "Nossa estratégia não é ser uma prestadora de serviços, mas uma produtora de petróleo e gás", disse ontem o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli. "Estamos dispostos a fazer todas as parcerias necessárias para isso."
As declarações foram feitas em Belo Horizonte, numa apresentação que deveria ser para investidores mas acabou contando com a presença apenas da imprensa. Segundo Gabrielli, a Petrobras não quer ser, necessariamente, a única produtora. Nem quer estar presente apenas em empresas onde seja majoritária. "Temos várias experiências em que somos minoritários", disse ele, citando como exemplo a parceria com a Shell em Bijupirá, na Bacia de Campos.
As declarações do presidente da Petrobras sugerem que a empresa brasileira estaria disposta a aceitar uma participação minoritária numa sociedade com a YPFB. Como majoritária, a estatal boliviana garantiria o controle da exploração para o governo da Bolívia. Quando questionado sobre o real significado das suas declarações, Gabrielli apenas sorriu. Depois completou: "Por mais que você insista, não vou entrar em detalhes".
A declaração feita pelo presidente boliviano, Evo Morales, em visita ao Brasil anteontem, de que quer sócios e não patrões, não irritou Gabrielli.
Segundo ele, foi exatamente esta frase que ele próprio disse a Morales em seu primeiro encontro com o presidente. "Nós queremos ser sócios da YPFB."
Uma comissão formada por representantes das duas empresas, Petrobras e YPFB, e dos dois governos vai se reunir na próxima semana, no Rio, para discutir o assunto. Os brasileiros tentam evitar que o debate sobre o tema seja travado na mídia, o que complicaria as possibilidades de acordo.
Segundo Gabrielli, o compromisso assumido com Morales, anteontem, é no sentido de manter a discussão no "âmbito da mesa negocial".
Oficialmente, Petrobras e o governo brasileiro negam ter conhecimento sobre a intenção da Bolívia de, ainda no mês de abril, instituir um novo modelo contratual que transformaria as concessionárias de exploração de petróleo em prestadoras de serviço e transferiria o controle dos campos à estatal YPFB. A medida colocaria em prática a nacionalização das reservas que já vigora, pelo menos na teoria, desde a publicação da Lei dos Hidrocarbonetos.
A Petrobras foi a única das multinacionais de exploração de petróleo e gás com atuação na Bolívia a não ameaçar entrar com um recurso no tribunal de resolução de controvérsias do Banco Mundial (Bird), devido às novas regras.
Gabrielli explicou ontem que a postura da estatal brasileira é coerente com a sua estratégia. "As empresas situam-se de forma diferenciada", declarou.
Embora resista a aceitar um papel de prestador de serviço na Bolívia, a companhia brasileira de petróleo já atua nesta condição em pelo menos um país, o México. "A lei mexicana não permite estrangeiros na exploração", justificou o presidente. Segundo ele, a Petrobras tem interesse de entrar na exploração de águas profundas no México. Mas não poderá fazê-lo por causa da legislação.
De acordo com Gabrielli, uma prestadora de serviços corre menos risco, mas tem menos retorno financeiro. A empresa produtora detém a expertise no processamento e a capacidade de fazer a gestão mais adequada dos recursos.
A Petrobras já investiu US$ 1,5 bilhão na Bolívia desde 1996. Outros US$ 2 bilhões foram aplicados na construção do gasoduto.
O presidente informou ontem que, em relação às mudanças no mercado de petróleo da Venezuela, não haverá prejuízos para Petrobras no balanço global dos 14 projetos que a empresa tem naquele país. "A vida é complicada mesmo no mercado de petróleo e gás", brincou ele. "O mundo do petróleo é assim, não é só uma característica da América Latina."
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