Redação/Assessoria
Há seis anos, a Argentina lançou um ambicioso programa de investimentos para permitir a exploração das maiores reservas de petróleo e gás do país, localizadas no norte da Patagônia e conhecidas como Vaca Muerta. Pelo planejamento do governo e de seus parceiros comerciais, espera-se que a produção argentina de combustíveis fósseis do país até 2025, o que seria estratégico para alavancar a recuperação econômica do país. No entanto, de acordo com um relatório publicado na semana passada pelo Institute for Energy Economics and Financial Analysis (IEEFA), o plano enfrenta fortes obstáculos decorrentes de questões fiscais, mercadológicas, políticas e ambientais que podem comprometer sua viabilidade.
"O plano de exploração de Vaca Muerta promete subsídios inviáveis, depende de empresas argentinas financeiramente fracas e espera atrair empresas globais de petróleo e gás que têm oportunidades melhores em outros lugares", disse Tom Sanzillo, diretor financeiro do IEEFA e e coautor do relatório. "O progresso do projeto é lento, os compromissos são escassos e os planos futuros não são realistas".
O plano requer subsídios substanciais de longo prazo, que são inviáveis para os cofres argentinos. De 2016 a 2018, a Argentina reduziu esse subsídios em 54% (de US$ 15,6 bilhões para US$ 7,2 bilhões). O governo e a economia argentina estão destroçados por causa da inflação alta, a desvalorização da moeda nacional (peso), déficits fiscais e uma política comercial falida, que forçaram o país a recorrer a um resgate econômico pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), que emprestou US$ 57 bilhões à Argentina. A queda nos subsídios deve continuar no futuro, já que o governo se comprometeu a reduzir ainda mais seus gastos. Isso afetará o projeto de Vaca Muerta exatamente no momento em que os responsáveis por ele mais necessitariam de subsídios para cumprir com os objetivos ambiciosos de produção estabelecidos pelas autoridades argentinas.
O apoio de investidores externos é fundamental para o êxito do projeto. O plano atual exige que o governo e as empresas com sede na Argentina custeiem 64% do desenvolvimento de Vaca Muerta, sendo que essa parcela seria assumida por parceiros comerciais globais no longo prazo. No entanto, essa expectativa é pouco realista, já que o corte recente de subsídios realizado em janeiro passado levou a Tecpetrol, um dos sócios globais chave do projeto, a reduzir sua produção, dispensar funcionários e ameaçar o governo com um processo judicial. A YPF, principal produtor argentino, também expressou preocupação que a redução dos subsídios poderia afetar o desempenho financeiro da empresa.
Esse cenário está espalhando incertezas junto aos investidores estrangeiros, já que os riscos enfrentados pelo projeto são desanimadores. A Argentina enfrenta instabilidade macroeconômica (com desvalorização do peso e aumento expressivo da dívida), incerteza política, inadequação da infraestrutura e da rede de transporte, escassez de água, e crescente oposição pública, incluindo protestos de grupos de direitos indígenas.
Tudo isso deixa o futuro de Vaca Muerta em xeque. "A Argentina está contando com os investidores estrangeiros para salvar esse projeto e reativar a economia nacional", aponta Kathy Hipple, analista financeira do IEEFA e coautora do relatório. "As empresas globais de petróleo e gás dependem de subsídios na Argentina devido aos altos níveis de risco operacional. A suposição de que o setor privado aumentará o investimento à medida que o governo reduz seu compromisso não é realista e provavelmente afetará as metas agressivas de produção definidas pelo país para Vaca Muerta".
A maioria das grandes companhias estrangeiras envolvidas em Vaca Muerta já deixou claro que sua participação se baseará em subsídios. Seus compromissos financeiros, até agora, têm sido pequenos e tentativos. Mesmo com a vigência dos acordos, o desenvolvimento real tem sido lento. A indústria global do petróleo e gás está se recuperando de uma década de destruição de valor por gastos deficientes de capital. A indústria enfrenta os desafios dos investidores que questionam cada vez mais os investimentos altamente especulativos. Nos últimos seis anos, foram lançados 31 projetos em Vaca Muerta. Apenas cinco estão em desenvolvimento ativo, e alguns deles estão ameaçados agora.
Os investidores estão preocupados com o ritmo lento de desenvolvimento em Vaca Muerta em comparação com outras regiões de produção de gás e petróleo não convencionais, como a Bacia Permiana e de Eagle Ford, ambas nos Estados Unidos. Seis anos após o início do projeto, Vaca Muerta abriu apenas 342 poços de gás e petróleo não convencionais. Em comparação, a Bacia Permiana já contava com 3,5 mil poços abertos e em produção ao final deste mesmo período de tempo. Eagle Ford já tinha 478 poços abertos após dois anos de desenvolvimento.
A redução abrupta do programa de subsídios para a produção na Argentina, anunciada em janeiro passado, mas retroativamente aplicado para a produção de 2018, está afetando a confiança dos investidores. Quando o governo fez o anúncio, a agência de classificação de crédito Moody's considerou esta ação como um "crédito negativo" para Tecpetrol, YPF e BP. Outras empresas afetadas pela decisão são a Total, Wintershall, Shell e ExxonMobil. "Esta mudança na política energética pode debilitar a confiança dos investidores e do entorno empresarial no setor energético, e provavelmente persuadirá as empresas para que adiem ou reduzam o gasto de capital em projetos de gás não convencional", diz a Moody's.
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