Tecnologia

UFSC desenvolve solda subaquática para a Petrobras

Revista Metal Mecân
23/08/2004 03:00
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 Os bons resultados que são obtidos pela Petrobras na prospecção de poços no mar e a conseqüente ampliação do seu parque de equipamentos começam a influir positivamente na área de pesquisa tecnológica. Uma modalidade avançada e inédita de soldagem, a chamada soldagem molhada (soldagem subaquática direta) está em teste há nove meses pela companhia em serviços de reparos na plataforma semi-submergível P-27, na Bacia de Campos (RJ).
Caso a nova tecnologia seja aprovada, poderá ser posteriormente agregada pela Petrobras ao seu instrumental de manutenção, que vem sendo ampliado quantitativamente e atualizado em termos tecnológicos.
"Estamos analisando desde os aspectos técnicos até a relação custo-benefício da nova tecnologia", diz o engenheiro Alexandre Pope, da Petrobras, coordenador dos teste juntamente com pesquisadores do Laboratório de Soldagem (Labsolda) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), que desenvolveu a tecnologia por encomenda da estatal. Ela foi disponibilizada para a Petrobras em duas versões, os aparelhos Hiper 1 e Hiper 2, ambos empregados na soldagem de peças estruturais danificadas da P-27.
O grande diferencial da soldagem molhada é permitir ao operador-mergulhador trabalhar diretamente sobre as partes submersas das peças sem a proteção de um ambiente artificial, como na tradicional soldagem a seco, método usado pela indústria naval para reparos subaquáticos.
Em vez de trabalhar protegido por uma campânula, junto com o equipamento de soldagem, o operador atua a descoberto, munido apenas dos cabos de solda conectados às fontes de soldagem. É um sistema, dizem os técnicos, muito mais rápido e barato. "É o operador que se desloca, não a pesada campânula de proteção", explica Jair Carlos Dutra, pesquisador do Labsolda e coordenador do projeto pelo lado da UFSC. "A nova tecnologia reduz à metade o tempo gasto neste tipo de conserto".
Foi, aliás, a necessidade de reduzir os custos e o tempo de operação das soldagens submersas, assim como o número de dias parados, que levou a Petrobras a associar-se com o Labsolda para o desenvolvimento da tecnologia. A soldagem a seco tende a tornar-se cada vez mais antieconômica à medida que a empresa investe em equipamentos de prospecção mais modernos, transporte e armazenamento de petróleo.
As recentes descobertas de poços de petróleo pela empresa e pelas companhias petrolíferas concessionárias, como a Shell, principalmente na Bacia de Campos, elevaram a produção brasileira de 165 mil barris diários na década de 1970 para os atuais 1,6 milhão de barris, obrigando a Petrobras a encomendar a estaleiros nacionais três plataformas de petróleo e vários navios de apoio, além do reparo e modernização de plataformas e navios antigos ou obsoletos.
A descoberta, em 2003, de um poço no litoral norte de São Paulo com uma reserva de 400 bilhões de metros cúbicos de gás natural aumenta ainda mais a necessidade de equipamentos, e de ferramentas de manutenção cada vez mais modernas e econômicas.

Apoio - Iniciada pelo Labsolda ainda em 1997, a pesquisa sobre a soldagem molhada teve 25% dos recursos de financiamento destinados pela Petrobras, por meio do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). O montante despendido até agora foi de R$ 500 mil. A Petrobras já garantiu mais recursos para este ano, que deve ser o sexto e último de pesquisa.
Quatro pesquisadores do Labsolda trabalharam no projeto, incluindo o desenvolvimento dos aparelhos. Os mergulhadores contratados pela estatal para os reparos também foram treinados no Labsolda.
Em condições naturais, o Hiper 1 e o Hiper 2 geram calor por processo físico, semelhante ao da solda seca, resultante da diferença de potencial e de tensões entre o material a ser soldado e o eletrodo, constituído de um bastão de metal do tamanho de uma caneta, que é fundido juntamente com a peça soldada. No caso de operação subaquática, no entanto, a queima do revestimento especial do eletrodo produz um ambiente gasoso em torno da área de soldagem, como uma pequena bolha. Gases como do dióxido de carbono e o hidrogênio formam uma camada de cerca de 10 mm de espessura, que isola a solda da água que o rodeia.
A diferença ente o Hiper 1 e o 2 está no tipo de eletrodo utilizado. Enquanto o Hiper 1 funciona apenas com eletrodos de tamanho comum, que precisam ser freqüentemente trocados, o Hiper 2 pode operar com soldagem de fluxo contínuo. O aparelho admite a acoplagem de eletrodo tubular, arame contínuo enrolado em um carretel e gasto de forma ininterrupta durante o processo de soldagem.
A principal limitação da soldagem molhada é a relativamente pequena profundidade em que pode ser executada. Dado que os mergulhadores trabalham sem ambiente de proteção, o procedimento só pode ser empregado até a profundidade máxima de 30 metros. Profundidades maiores continuarão a exigir a soldagem a seco, que pode ser executada inclusive em águas profundas. A soldagem hiperbárica a seco, realizada em recipiente pressurizado, admite profundidades de até mil metros, embora soldagens experimentais já tenham sido feitas a 2 mil metros. O Labsolda chegou a testar um equipamento hiperbárico em seu laboratório à profundidade experimental de 500 metros.
A soldagem molhada pode ser feita na água doce ou salgada e, com algumas adaptações, até em dutos e reservatórios de efluentes industriais, onde a água contém elementos químicos não presentes naturalmente. Como a tecnologia é muito específica, não há, por enquanto, interesse das indústrias na produção em escala dos aparelhos. Para os técnicos, a situação deve mudar se a tecnologia for adotada pela Petrobras.
O Labsolda também investe em solda para foguetes. Junto com técnicos do Centro Técnico Aeroespacial (CTA), de São José dos Campos (SP), estuda uma modalidade de soldagem a plasma, totalmente automatizada, para atender à demanda de fabricação dos envelopes-motores foguetes desenvolvidos no Brasil.
Baseada no processo TIG, a tecnologia já é usada nas linhas de produção do CTA, como, por exemplo, na montagem da Sonda III-XV30. O sistema emprega um arco elétrico forçado a atravessar um orifício calibrado para executar a fusão do material, de modo a garantir maiores densidades de energia em comparação com o processo manual, que era antes utilizado.
"Esta nova técnica aumenta a qualidade, o nível de segurança e a produtividade do trabalho", diz o engenheiro José Augusto Orlowski, do CTA e um dos coordenadores da pesquisa. "Isso, sem falar na redução dos custos de fabricação". Segundo ele, a tecnologia destaca-se pela flexibilidade. Na soldagem plasma automatizada, o que define o trabalho é o diâmetro do orifício por onde o arco - formado entre o eletrodo de tungstênio embutido na tocha e a peça - é obrigado a passar, assim como da corrente elétrica usada. Quanto maior o orifício e a corrente elétrica, maior a espessura do trabalho de solda, que é o resultante, como no processo clássico, da fusão entre o metal-base e o arame de preenchimento.
A tecnologia é indicada para soldagem de aços de ultra-alta resistência, com baixíssimos teores de fósforo e enxofre e que tenham grande resistência mecânica e extrema tenacidade, além de serem altamente resistentes a trincas sob altas temperaturas. Por exemplo, nos aços para foguetes, estas características são reforçadas por elementos de ligas.
"É um tipo de soldagem que resolve uma série de problemas tecnológicos criados pelos aços superespeciais", diz Jair Dutra, do Labsolda. "Uma vez transferida para a iniciativa privada, esta tecnologia poderá ser aplicada sem nenhum problema pela indústria automobilística, farmacêutica, nuclear e de alimentos".

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