Jornal do Commercio
A União Europeia adota pesadas barreiras sobre o biodiesel americano, acusando os exportadores dos Estados Unidos de práticas desleais e até de misturar biodiesel brasileiro nos produtos comercializados. Diante da medida, os produtores europeus já temem que exportadores americanos de biodiesel promovam uma triangulação de suas vendas por meio do Brasil para driblar as novas barreiras aduaneiras que a Europa adotará. A UE promete monitorar essa eventual triangulação.
A UE anunciou ontem que os 27 países do bloco aprovaram sobretaxas contra o biodiesel americano por estar entrando no mercado europeu com dumping. O maior contencioso em torno do comércio de biocombustíveis não ocorre por acaso. Americanos e europeus disputam, em pela crise mundial, um mercado avaliado em US$ 10 bilhões.
A partir da semana que vem, a UE vai barrar a importação americana. As medidas antidumping vão variar de dois a 19 euros por cada 100 quilos de biodiesel importado. Além disso, uma sobretaxa que irá varia de 23 a 26 euros a cada cem quilos será aplicada para compensar pelos subsídios recebidos pelos produtores nos EUA.
A queixa partiu dos próprios produtores de biodiesel da Europa, que alegam que, desde o ano passado, o produto americano, subsidiado, está gerando a falência de várias plantas na Espanha, Alemanha e no Leste Europeu. Ainda durante a presidência de George W. Bush, a Casa Branca rejeitou a acusação de estar exportando biocombustível com dumping.
A realidade é que, em apenas três anos, as exportações americanas passaram de meras 7 mil toneladas para mais de 1,5 milhão em 2008. A acusação dos europeus era ainda de que as empresas americanas importaram até setembro de 2008 biodiesel a preços baixos da Argentina e, em menos escala do Brasil, e adicionam apenas 5% de sua própria produção. Com isso, já estariam autorizados a coletar os subsídios do governo para a produção e exportação. O valor da ajuda estatal chegaria a US$ 1 por galão.
No Itamaraty, o sentimento é de que os europeus tem “certa razão” em adotar as barreiras, já que os americanos estariam adotando práticas desleais. Segundo uma investigação preliminar dos europeus, a importação de produtos americanos acabou gerando prejuízos para as empresas da UE. Entre 2005 e 2008, a margem de lucros das empresas de biocombustível caiu de 18% para menos de 6%. O retorno de investimentos caiu ainda em 80%.
Raffaello Garofalo, o secretário-geral da principal entidade de produtores de biodiesel da Europa, a European Biodiesel Board, alerta que os produtores acompanharão com atenção qualquer tentativa de triangulação de comércio americano.
O temor dos europeus é de que as usinas americanas enviem seu biodiesel ao Brasil e reexportem ao mercado europeu, fugindo das sobretaxas. “Não vamos tolerar isso. Temos meios de monitorar esse comércio e, se essa triangulação ocorrer, vamos abrir mais um processo”, afirmou Garofalo.
A disputa vem em uma plena crise, em ambos os lados do Atlântico. Vinte por cento das usinas de biocombustíveis dos Estados Unidos podem pedir concordata este ano. Na Europa, um terço dos planos de investimentos na Espanha, Itália ou Alemanha está paralisado. Para especialistas, a crise pode explicitar algo que muitos já sabiam: a indústria do biocombustível nos países ricos não é competitiva e nem sustentável sem a existência de subsídios bilionários.
Nos Estados Unidos, a empresa Renew Energy, no estado de Wisconsin, pediu concordata há um mês. Ela afirmava ser a maior trituradora de milho do mundo. No início desse mês, a Cascade Grain, de Oregon, também declarou falência. Em apenas um ano, 9% de todas as plantas de etanol dos Estados Unidos fecharam suas portas. Isso inclui ainda a Northeast Biofuels, que investiu US$ 200 milhões.
A primeira grande usina a dar sinais da crise foi a Verasun Energy, a segunda maior dos Estados Unidos. Em outubro, ela declarou sua falência. Segundo a Associação de Combustíveis Renováveis dos EUA, 16% das usinas do país já estão paralisadas. Segundo um relatório da gigante Archer Daniels Midland (ADM), a taxa é maior: 21%. Entre os elementos da crise estão a dificuldade em manter financiamentos a projetos de longo prazo e, principalmente, a queda já de 70% nos preços do petróleo.
Na Europa, além desses fatores, produtores insistem que a importação de biodiesel americano subsidiado e do etanol brasileiro, por sua competitividade, estão obrigando muitos a abandonar o setor. Segundo Garofalo, 55 usinas na Europa já fecharam suas portas ou estão apenas produzindo 5% de sua capacidade. “A situação é crítica. Não descarto que as medidas de sobretaxa tenham chegado tarde demais”, concluiu.
Pela decisão de ontem da UE, a empresa Archer Daniels Midland (ADM), pagará uma sobretaxa de 26 euros por cada 100 quilos de biodiesel exportado. A Cargill pagará 27 euros. Já a Imperium Renewables pagará 29 euros, contra 28 da Green Earth Fuels. A maior punição será imposta contra a Peter Cremer North America, que pagará 41 euros por 100 quilos exportados.
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