A adoção de redes eficientes poderá reduzir perdas do sistema interligado.
Valor Econômico
A adoção gradual das redes inteligentes de energia elétrica (smart grid, em inglês) ao longo desta década poderá reduzir perdas do sistema interligado, aumentar a eficiência energética, mudar a relação entre concessionárias e clientes e permitir um novo impulso nas fontes alternativas como solar e eólica na matriz.
A implementação das redes deverá criar um mercado de pouco mais de US$ 36 bilhões até 2022, segundo estimativas da consultoria Northeast, o que deve tornar o país um dos dez maiores mercados no mundo. O smart grid também poderá significar uma revolução no papel do consumidor, que, além de optar por tarifas diferenciadas, poderá gerar a própria energia em sua residência e ter créditos com o sistema.
"O smart grid vai representar uma quebra de paradigma, já que traz consigo o potencial de mudar a forma como os consumidores tratam a energia", afirma o presidente da Empresa de Pesquisas Energéticas (EPE), Mauricio Tolmasquim. "Além de racionalizar seu uso, o que elevará a produtividade e poderá exigir menos investimentos em novas usinas, ele poderá transformar o consumidor em micro gerador." Tolmasquim ressalta, porém, que o smart grid ainda é uma tecnologia em desenvolvimento, e que exige pesados investimentos.
A implementação das redes permitirá que as máquinas e equipamentos conversem entre si, buscando eficiência. Também possibilitará que cada eletrodoméstico tenha seu consumo avaliado pelo consumidor em tempo real. Este poderá ter à sua disposição tarifas diferenciadas por horário, gerenciando, assim, o horário de funcionamento de eletrodomésticos, que poderão ser ligados de madrugada, quando a energia for mais barata. "O smart grid tem um grande potencial não apenas de tornar a rede mais eficiente, como de reduzir perdas e a necessidade de investimentos em novas usinas. Por isso deveria ser acelerado", diz o ex-presidente da Eletrobrás e da Light, José Luiz Alquéres. Hoje as perdas no sistema elétrico estão ao redor de 15%, pouco mais que o dobro da média mundial. Isso acarreta prejuízos superiores a R$ 8 bilhões anuais às empresas.
Um exemplo da eficiência que poderá ser conquistada está na construção civil. Para o presidente do Conselho Brasileiro de Construção Sustentável (CBCS), Marcelo Takaoka, as redes inteligentes poderão causar uma revolução. "Somente com a adoção de práticas sustentáveis de conservação e uso racional na construção civil é possível reduzir entre 30% e 40% o consumo de energia", afirma o empresário. No Brasil, a participação dos edifícios no consumo de energia elétrica no setor é superior a 45%.
"Imagine o que pode ser melhorado com a conservação de energia no funcionamento dos elevadores. Já a micro geração poderá fazer com que edifícios apostem em fontes alternativas, mantendo a matriz cada vez mais limpa", diz Takaoka. Enquanto no Brasil 90% da matriz elétrica está baseada em energias limpas, com as usinas hidrelétricas respondendo por 80% da geração, no mundo apenas 18% das matrizes elétricas vêm de fontes renováveis. O setor energético responde por cerca de 16,5% das emissões de gases de efeito estufa no Brasil, um percentual muito abaixo do verificado no mundo, onde a energia é o principal setor poluidor, respondendo por 65% das emissões de dióxido de carbono.
As redes inteligentes deverão estimular a micro geração de energia e o avanço de fontes renováveis nos grandes centros. O cliente residencial pode ter painéis solares instalados em sua casa e poderá até vender parte dessa energia à rede ou abater parte de sua conta com esse crédito. "Os medidores inteligentes são condição básica para a geração distribuída solar, porque os aparelhos permitem saber se o cliente está consumindo ou se está exportando para a rede", diz Paulo Ricardo Bombassaro, diretor de engenharia da CPFL Energia. Na Europa, algumas concessionárias já oferecem a possibilidade de o cliente escolher se sua fonte de energia será renovável ou térmica.
Em paralelo, essa tecnologia poderá permitir a instalação de microgeradores eólicos em condomínios e casas, com cada consumidor podendo disponibilizar excedente de energia ao sistema interligado. "O consumidor passa a ter mais ferramentas para monitorar o uso da energia e, como a eólica é uma fonte limpa, podemos ter mais estímulos com o smart grid", diz Elbia Mello, presidente-executiva da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica).
Resolução da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) publicada no início do ano já permite que o consumidor residencial que tiver excedente de geração de energia de fonte própria, como energia solar, possa acumular créditos para descontar da conta de luz elétrica a partir de 2013. O tema inclusive foi tratado pela presidente Dilma Rousseff, em seu programa "Café com a Presidenta". Outra parte da regulamentação sobre a implementação das redes inteligentes - como os medidores a serem instalados nos clientes de baixa renda e o estabelecimento de tarifas horárias - ainda está em discussão pública. A expectativa no mercado é de que os pontos possam ser anunciados até o início de 2013.
Com um mercado potencial de US$ 36 bilhões, gigantes como IBM, Oracle, ABB, Siemens estão de olho nas encomendas. A parte visível delas são os medidores. O governo também está olhando o tema e busca incentivar pesquisa e desenvolvimento na área no país. Para ter uma ideia do mercado, o setor hoje conta com pouco mais de 63 milhões de medidores e o custo de um equipamento inteligente estaria ao redor de R$ 200 por medidor.
A Aneel ainda discute a regulação do tema. "Definida a regulação, estaremos de olho nesse mercado, pensando em termos uma operação local própria ou com parceria com terceiros", diz Marcelo Prado, diretor de marketing da GE Energia para a América Latina.
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