A entrada em operação da usina nuclear de Angra 3, prevista para 2015, deverá sofrer adiamento de pelo menos um ano. O atraso na conclusão da obra será reflexo, em parte, da lentidão da Eletronuclear, estatal controlada pela Eletrobras, em realizar a licitação para adquirir equipamentos de toda a infraestrutura eletromecânica da nova usina.
A previsão inicial da estatal era de que o edital, estimado em R$ 1,5 bilhão, fosse publicado em setembro do ano passado. A publicação, no entanto, foi adiada para o fim do ano, e depois novamente prorrogada para março deste ano. A realidade é que, até agora, o edital não saiu. Essa situação deve comprometer o início das operações da usina, avalia o vice-diretor da do programa de engenharia nuclear da Coppe, pós-graduação de engenharia da UFRJ, Aquilino Senra. "Dada a situação atual, não acredito que Angra 3 fique pronta antes de 2016", comentou.
Segundo a Eletronuclear, "o edital está pronto, dependendo somente de aprovações internas". A empresa não soube informar quando o texto será publicado. O atraso, segundo a companhia, "deve-se ao fato de um edital desse porte ter de ser cuidadosamente verificado, analisado e rechecado". Só as especificações técnicas para os serviços e condições técnicas para os fornecimentos envolvem mais de 1,5 mil folhas.
Até dois meses atrás, havia 2,3 mil funcionários da construtora Andrade Gutierrez e de suas subcontratadas trabalhando nas obras civis de Angra 3. Estima-se que, no pico da construção, cerca de 5 mil trabalhadores estejam em atividade. Hoje Angra 3 tem executado cerca de 15% de seu projeto.
A Eletronuclear nega que o atraso em Angra 3 seja reflexo do acidente nuclear ocorrido em Fukushima, no Japão. Não há dúvidas, porém, da influência do episódio sobre o plano nuclear brasileiro, que prevê a construção de oito novas usinas nucleares.
Na semana passada, o debate sobre o programa nuclear brasileiro ficou tenso durante uma audiência da Comissão de Meio Ambiente da Câmara. Durante o encontro, que contou com a presença do presidente da Eletronuclear, Othon Luiz Pinheiro da Silva, o deputado Giovani Cherini (PDT-RS), que preside a comissão, afirmou que o programa nuclear brasileiro tem operado à revelia do Congresso e que o país pode ser vítima de verdadeiras "bombas-relógio" se não se precaver com as medidas de segurança necessárias.
Cherini afirmou que, embora o preço total estimado para a usina seja de aproximadamente R$ 10 bilhões, já se calcula que a obra poderá chegar a R$ 23 bilhões. Provocado pelo parlamentar, Othon Luiz Pinheiro da Silva disse ser um "ambientalista de carteirinha" e que a energia nuclear é melhor exemplo do ambientalismo, porque não colabora com o aquecimento global.
Na Câmara, os parlamentares estão colhendo assinaturas para que seja realizado um plebiscito sobre a instalação de novas usinas nucleares no país. Questionado sobre a realização da consulta à população, o presidente da Eletronuclear afirmou que apoiaria o plebiscito, caso ocorra antes uma campanha para elucidar as dúvidas a respeito da geração de energia elétrica por fissão nuclear.
Antes da tragédia no Japão, o governo estava com um estudo pronto nas mãos para anunciar os locais onde seriam instaladas quatro novas usinas no país. O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, chegou a afirmar que a instalação dos projetos, desenhados para consumir investimentos de R$ 30 bilhões, vinha sendo disputada por alguns Estados, principalmente da região Nordeste do país. "Vá perguntar hoje para algum município se ele quer sediar algum usina nuclear", provocou o deputado Giovani Cherini.
Hoje, as duas usinas nucleares em atividade no país - Angra 1 e 2 - fornecem juntas 2 mil megawatts (MW) de energia, o que representa 1,8% da matriz energética brasileira. Com Angra 3, deverão ser adicionados mais 1.405 MW na fonte nuclear.