O Globo
Dois meses depois de um leilão marcado pela polêmica, a hidrelétrica de Belo Monte continua cercada pelos mesmos dilemas e incertezas. Embora o presidente Luiz Inácio Lula da Silva desembarque nesta terça-feira em Altamira para um ato a favor da usina, um sobrevoo da região da Volta do Xingu e um encontro com lideranças locais, as discussões nos bastidores para formatar o consórcio final e o planejamento da obra permanecem em torno de questões que chegaram a ameaçar a realização da licitação.
O consórcio Norte Energia ainda não conseguiu fechar um acordo com os autoprodutores - grandes empresas que constroem usinas para seu próprio consumo - para que possam integrar a Sociedade de Propósito Específico (SPE) que vai operar a usina. O consórcio tem até 16 de julho para fechar a empresa, mas os planos são tentar antecipar ao máximo essa data.
Na semana passada, uma reunião na sede da Eletrobras, em Brasília, não foi suficiente para convencer os autoprodutores a aderirem ao projeto. Eles não obtiveram dos diretores da Eletrobras, Valter Cardeal, e da Eletronorte, Adhemar Palocci, respostas para perguntas básicas: quem são os sócios do empreendimento, quem vai construir a usina e quanto vai custar a obra. Essas já eram as interrogações dos investidores antes do leilão.
Entre os autoprodutores interessados estão Braskem, CSN, Votorantim e Gerdau. Mas, com essas incertezas, a tendência é a constituição de uma "SPE dentro da SPE", a ser capitaneada pela Gaia Energia, o braço autoprodutor do Grupo Bertin.
Sem demanda para ser considerada uma grande autoprodutora, a Gaia vai abrir espaço na SPE a outras empresas. Essa presença é estratégica: só com autoprodutor o Norte Energia poderá vender livremente 20% da sua energia, com preço acima dos R$ 77,9 o megawatt/hora estipulado no leilão.
As dúvidas são grandes, mesmo com o perfil eminentemente estatal do empreendimento. Além da Chesf, estarão na SPE Eletrobras, Eletronorte e os fundos de pensão de Petrobras (Petros), Caixa Econômica Federal (Funcef) e Banco do Brasil (Previ).
- Ninguém vai colocar seu dinheiro na obra sem saber direito quem são os fornecedores. Há uma indefinição total - diz um observador direto das negociações.
Para contornar esse problema, os técnicos estão correndo para fechar acordos com fornecedores de turbinas e equipamentos, além de um novo planejamento da obra, diz uma fonte de uma das estatais envolvidas.
Em vez de dois canais, os técnicos preveem apenas um. Com isso, será possível deixar de retirar 500 mil metros cúbicos de rocha e reduzir em 40 milhões de metros cúbicos o volume de escavações previsto no projeto original, equivalente a um Canal do Panamá. Com as mudanças, diz essa fonte, estima-se que a economia pode ultrapassar R$ 1 bilhão do projeto original - uma redução importante no valor real da usina, estimado em R$ 25 bilhões, apesar de o orçamento oficial ser de R$ 19 bilhões.
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