Jornal do Commercio
A desaceleração na economia brasileira, provocada pela crise financeira internacional, reverterá a tendência de déficit no balanço entre oferta e demanda por energia em 2009. Antes da crise, projeções oficiais do governo e de agentes do mercado estimavam um desequilíbrio entre 100 MW médios e 900 MW médios para o próximo ano.
Em maio deste ano, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) previa um crescimento médio da economia de 5% entre 2009 e 2012 e projetava um déficit no sistema de 900 MW médios para o próximo ano. A partir de outubro, quando a estimativa do PIB para o período foi reduzida para 4,5% na esteira da crise internacional, o ONS passou a prever um superávit de 334 MW médios em 2009.
A queda na demanda industrial é a principal explicação para essa reversão de cenário. "As mineradoras, siderúrgicas e as montadoras registram queda de 40% no consumo", diz o diretor-presidente da Energias do Brasil, António Pita de Abreu.
A empresa privada de origem portuguesa tem expectativa semelhante à do ONS. "Com o Produto Interno Bruto (PIB) crescendo ligeiramente abaixo de 3%, o déficit estrutural de 300 MW médios que projetávamos para 2009 será revertido para um superávit entre 600 MW médios e 700 MW médios", afirma.
desaceleração. Os dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) mostram a desaceleração da demanda por eletricidade no País, provocada pela crise internacional. Na comparação entre novembro de 2008 e igual intervalo de 2007, o consumo de energia na classe industrial cresceu apenas 0,1%.
"A desaceleração do ritmo do crescimento do consumo industrial está relacionada ao fato de que importantes segmentos, como siderurgia, mineração, automobilístico e correlatos reduziram sua produção", avalia a EPE.
Este ano, o discurso dos agentes é de que o cenário econômico é incerto, mas que a tendência é de retração do PIB na comparação com o desempenho deste ano. O mais recente relatório Focus do Banco Central, que reúne a expectativa do mercado sobre o desempenho da economia, indica que o PIB de 2008 fechará com um crescimento de 5,6%. Para 2009, as projeções já sinalizam uma desaceleração do PIB para 2,4%.
"O cenário é incerto porque ninguém sabe o impacto efetivo da crise na economia real", afirma a coordenadora do Núcleo de Estudos Econômicos e Financeiros da consultoria Andrade & Canellas, Fátima Moreira.
Apesar do PIB menor, as projeções para o consumo de energia em 2009 superam o resultado de 2008. Empresas como a Energias do Brasil e a CPFL Energia prevêem aumento da demanda em torno de 5% para o ano que vem. A estimativa da EPE é um pouco menor, na casa de 4,6%. A mesma EPE trabalha com a expectativa de que a expansão do consumo fechará este ano em 4%, número que é inferior, inclusive, ao PIB esperado pelo mercado para 2008. Tradicionalmente, a demanda por eletricidade no Brasil supera o crescimento da economia.
"Este ano, o consumo industrial está abaixo do PIB industrial porque a alta do preço da energia estimulou investimentos das empresas em eficiência energética e em autoprodução de energia", explica Fátima, da Andrade & Canellas.
mercado livre. Segundo o sócio-diretor da comercializadora Comerc, Marcelo Parodi, a energia no mercado livre, constituído basicamente pelas grandes indústrias, era vendida entre R$ 170 e R$ 190/MWh para 2009 antes da crise. Além disso, o preço de liquidação das diferenças (PLD), referência das negociações no mercado de curto prazo, superou os R$ 500/MWh ao final de janeiro de 2008. Conseqüência disso foi a alta de 8,9% na autoprodução de eletricidade em outubro ante igual intervalo de 2007, segundo dados mais recentes da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE).
Ainda que a expansão do consumo de energia em 2009 supere a de 2008, o crescimento será menor do que o projetado originalmente. Pita de Abreu lembra que, antes da crise, a EPE trabalhava com uma expansão da demanda no próximo do ano em torno de 5,9%, que foi revisado inicialmente para 5,2% com os primeiros sinais de retração da economia - a estimativa mais recente da autarquia é de 4,6%.
"O primeiro alívio que a sobra de energia traz é a redução das penalidades pela falta de lastro físico para cobrir os contratos", avalia o presidente da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), Ricardo Lima. Antes da crise, cerca 1 mil MW médios era adquirida no mercado de curto prazo, sujeito às oscilações do PLD. "Com a retração da economia, essa exposição pode desaparecer ou cair para um volume muito pequeno", explica Parodi, da Comerc.
A falta de comprador para a energia no ano que vem provocou a queda do preço da eletricidade no mercado livre, tendo em vista que o cenário projetado por geradoras e comercializadoras para 2009 não se concretizará. "Os preços reagiram rapidamente, e a energia é negociada hoje entre R$ 120/MWh a R$ 130/MWh", diz Parodi.
Simulações da CPFL Energia indicavam que, para 2009, o mercado cativo estava mais vantajoso do que o livre antes da crise. De acordo com a projeção da companhia, o preço da energia no ambiente de contratação livre (ACL), em torno de R$ 162/MWh, estava 20% mais caro que na distribuição. Uma reversão da situação anterior, já que em alguns momentos os clientes livres chegaram a obter descontos de 55%.
"Se os preços continuassem nos patamares anteriores, o risco era de um movimento de retorno das indústrias para as distribuidoras", complementa Parodi.
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