Priscilla Lyrio
A indústria de petróleo e gás iniciou o ano de 2018 com um novo marco legal do Repetro: a publicação, pela Receita Federal do Brasil (RFB) da Instrução Normativa (IN) nº 1.781/2017, que teve o objetivo de regulamentar o regime aduaneiro especial de utilização econômica destinado a bens a serem utilizados nas atividades de exploração, desenvolvimento e produção das jazidas de petróleo e de gás natural (E&P), agora denominado Repetro-SPED.
Em um primeiro momento, a publicação da referida norma foi vista com otimismo -pensava-se que com a nova IN, finalmente, as operações de petróleo e gás estariam devidamente regulamentadas e a indústria poderia (voltar a) operar com segurança jurídica. Entretanto, no decorrer do aprofundamento do estudo do ato normativo, esse frenesi inicial acabou frustrado.
Assim que a referida IN foi publicada, a questão inicial referia-se à transição do Repetro “antigo”, regulamentado pela IN RFB nº 1.415/2013, para o Repetro-Sped, tendo em vista que muitas empresas já estavam em operação em janeiro de 2018 e/ou já haviam importado bens ao amparo do “antigo” Repetro. A resposta da IN nº 1.781/2017 foi apenas no sentido de fixar o termo final de 31/12/2020 para o Repetro “antigo”, e de estabelecer que os bens admitidos neste regime poderiam migrar para o Repetro-Sped mediante procedimento simplificado, na forma definida pela Coana –o qual, até a elaboração do presente artigo, ainda não foi divulgado.
A próxima questão relacionava-se aos bens que poderiam ser admitidos no “novo” Repetro. A indústria de E&P, ao analisar os Anexos da IN RFB nº 1.781/2017, se deparou com uma listagem de bens com a sua respectiva classificação fiscal. Diante dessa situação, questionaram sobre a possibilidade de se realizar uma interpretação extensiva dos bens elencados. Ocorre que diante do histórico de posicionamentos da RFB, a regra seria a interpretação restritiva desses Anexos. Logo, uma norma que, teoricamente, foi publicada para auxiliar as questões tributárias e aduaneiras das atividades de E&P estaria engessando as referidas operações.
A IN RFB nº 1.781/2017 ainda é questionável em diversos outros aspectos específicos de cada sujeito da cadeia das operações de E&P, como no caso das prestadoras de serviços que agora deveriam possuir inscrição no Cadastro de Contribuinte dos Estados para poderem emitir Nota Fiscal em todas as operações de entrada e de saída de mercadoria que realizassem, em atendimento a demanda do inciso IV do seu artigo 5º.
Ainda em janeiro de 2018, o “novo” Repetro ganhou os ares estaduais com a publicação do Convênio ICMS nº 3/2018, que dispôs sobre benefícios fiscais relacionados ao ICMS em operação com bens ou mercadorias destinadas às atividades de E&P.
O referido Convênio estabeleceu, basicamente, três benefícios fiscais relacionados ao ICMS: (i) redução de base de cálculo do ICMS incidente na importação ou nas operações de aquisição no mercado interno de bens ou mercadorias permanentes de forma que a carga tributária fosse equivalente a 3%; (ii) isenção do ICMS incidente na importação de bens ou mercadorias temporários; (iii) isenção do ICMS nas operações de exportação ou de venda a pessoa sediada no país dos bens e mercadorias temporários ou permanentes fabricados no país que viessem a ser, respectivamente, admitidos ou adquiridos nos termos dos itens (i) ou (ii).
A princípio, os referidos benefícios fiscais pareciam simples de serem implementados. Porém, devido às peculiaridades das operações de E&P, procedimentos ordinários tornam-se extraordinários. Como no caso de uma prestadora de serviços que realize uma venda a operadora sediada no país. Essa operação estaria isenta do ICMS, já que se enquadraria no item (iii). Ocorre que as aquisições realizadas pelas operadoras estariam previstas no item (i). Nesse sentido, estaríamos diante de uma situação um tanto quanto peculiar: saída de mercadoria isenta com a correspondente entrada no destinatário com redução de base de cálculo.
Os Estados que já incorporaram internamente as disposições do Convênio acima citado (Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Norte e Bahia) não trouxeram nenhuma novidade, e também não regulamentaram as questões operacionais advindas dessa incorporação.
Oportuno destacar, inclusive, que no Estado do Rio de Janeiro tramita o Projeto de Lei nº 3.660/2018, o qual prevê que o Repetro deveria ser aplicado apenas para a “fase exploratória”, o que causaria grande desvantagem competitiva para as empresas estabelecidas neste Estado, tendo em vista que na fase de produção ocorrem diversas operações de importação de equipamentos sobre as quais os benefícios fiscais trariam maiores reduções de custos.
Diante desse cenário, ainda estamos longe de uma pacificação interpretativa sobre o Repetro-SPED, devendo-se ainda considerar que a maioria dos Estados nem sequer se posicionaram sobre o assunto, o que ainda vai gerar muitas divergências quanto ao recolhimento do ICMS. Portanto, depreende-se que a regulamentação que temos hoje do “novo” Repetro mostra-se simplista diante da realidade do dia-a-dia das operações de E&P.
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Sobre a autora: Priscilla Lyrio é advogada do Escritório André Teixeira & Associados desde 2008. Trabalhou no Departamento de Impostos Indiretos da Deloitte Touche Tohmatsu. Pós-Graduada em Direito Empresarial pela Universidade Veiga de Almeida e em Direito Público pela Universidade Gama Filho. Graduada em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e graduanda em Ciências Contábeis pela Universidade Estácio de Sá.
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