Valor Econômico
Companhias estrangeiras interessadas em participar da exploração das imensas reservas de petróleo existentes na camada pré-sal da Bacia de Santos estão ficando apreensivas com a indefinição do modelo regulatório que o governo brasileiro vai adotar para o desenvolvimento de novos campos na região.
Elas estão preocupadas com os custos elevados dos investimentos que serão necessários para extrair o petróleo do pré-sal e temem que as condições impostas pelo governo para a participação de grupos estrangeiros sejam restritivas a ponto de reduzir seu interesse pelos reservatórios encontrados na área.
“O mais importante é assegurar que o novo sistema seja competitivo globalmente”, disse ao Valor o executivo que dirige as atividades de exploração de petróleo da anglo-holandesa Shell nas Américas, Marvin Odum. “As regras precisam ser definidas de forma que o Brasil possa competir pelos dólares disponíveis para investimentos no setor.”
A crise internacional fez os preços do petróleo despencar no ano passado. Embora eles tenham se recuperado um pouco nos últimos meses, a indústria ficou mais cautelosa e seu apetite por projetos muito arriscados esfriou. Mas a crise também empurrou para baixo os custos dos investimentos no setor, que estavam nas nuvens antes da crise.
“Há uma janela de oportunidade para que alguns investimentos sejam feitos a um custo menor”, afirmou Odum. “Pode ser vantajoso para o pré-sal, que levará anos para ser desenvolvido e produzir volumes significativos, e seria uma pena se essa janela fosse desperdiçada por falta de clareza sobre o caminho a seguir.”
O grupo interministerial que há meses está desenhando o modelo regulatório do pré-sal deve entregar sua proposta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva até o fim deste mês e o governo promete enviar o projeto ao Congresso em agosto. Investidores estrangeiros temem que as disputas entre os partidos que apoiam o governo e a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) criada para investigar a Petrobras façam a discussão se prolongar demais.
Os estrangeiros gostariam de ver mantido para o pré-sal o modelo de concessões em vigor desde a quebra do monopólio da Petrobras, em que as empresas pagam royalties pelo direito de explorar os recursos naturais do país. Mas o governo quer criar um sistema de partilha da produção, em que as empresas autorizadas a entrar no pré-sal terão que entregar ao governo o equivalente a uma fatia maior da sua produção, em dinheiro.
O governo está preocupado com a possibilidade de que as companhias estrangeiras usem seu poderio financeiro para levar vantagem sobre a Petrobras nos leilões em que os novos campos serão disputados e por isso está procurando maneiras de ajudar a estatal, que tem participação na maioria dos blocos leiloados antes da descoberta dos reservatórios do pré-sal.
“Se o pêndulo regulatório pender mais para o lado do governo do que para o do setor privado, o Brasil corre o risco de não conseguir atrair os recursos necessários para explorar o pré-sal”, afirmou o ex-embaixador dos EUA Anthony Harrington, que preside a consultoria Stonebridge International e tem entre seus clientes a Exxon Mobil, que controla a Esso no Brasil e opera um bloco promissor no pré-sal.
As empresas estrangeiras tem enorme interesse no petróleo da Bacia de Santos porque têm enfrentado dificuldades para adquirir novas reservas em outras regiões do planeta. A Shell tem hoje reservas equivalentes a quase 12 bilhões de barris de petróleo, mas precisa de novas áreas para aumentar sua produção sem por seu futuro em risco.
Ainda há muitas incertezas sobre a viabilidade econômica da exploração dos reservatórios do pré-sal, localizados a mais de 5 mil metros abaixo da superfície do mar, sob camadas espessas de areia, rochas e sal. O governo acredita que os depósitos da área contenham dezenas de bilhões de barris de petróleo.
O preço do barril de petróleo no mercado internacional passou de US$ 65 na sexta-feira, mas ainda está longe do pico alcançado em julho de 2008, quando o produto foi negociado a US$ 145 o barril. O presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, disse recentemente que a exploração do pré-sal será rentável mesmo se os preços voltarem para perto de US$ 45 o barril.
Odum prefere não arriscar nenhum palpite. “Muita gente diz que sabe o preço em que tudo vai funcionar, mas não há como ter certeza”, disse o executivo da Shell. “Existe obviamente um potencial enorme no pré-sal, mas o tamanho desses depósitos ainda está por ser definido e há riscos significativos para o seu desenvolvimento, equivalentes aos riscos associados tradicionalmente à fase exploratória.”
A Shell tem investimentos de US$ 31 bilhões programados para este ano no mundo inteiro e está prestes a deslanchar um plano de reorganização para reduzir custos e se tornar mais ágil. A divisão que será comandada por Odum, que estará no Brasil nesta semana para participar de uma conferência, administra um quinto das reservas da Shell e foi responsável por 22% da sua produção no ano passado.
A Shell foi a primeira empresa estrangeira a produzir petróleo no Brasil depois da abertura do setor, e no ano passado extraiu 23 mil barris por dia no país. Em agosto, quatro blocos que ela opera na Bacia de Campos devem começar a produzir. A Petrobras e a indiana ONGC são sócias do projeto, que terá capacidade para produzir 100 mil barris por dia. A Shell tem dez concessões no Brasil, incluindo três blocos do pré-sal que estão no início da fase exploratória. A companhia opera sozinha um deles e é sócia da Petrobras nos outros dois.
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