Qual foi o propósito da comunicação nos últimos seis meses na empresa em que você trabalha? Como você usou ou absorveu essa comunicação nesse período? Foi uma comunicação com propósito ou uma comunicação para evidência? Esse texto começa com três perguntas para te ajudar a encontrar uma resposta muito objetiva, se sua empresa fez o dever de casa e cuidou bem dos seus colaboradores ou não.
Em setembro, a maior parte das corporações no Brasil completou meio ano, ou seja, quase 200 dias, em regime de trabalho remoto obrigatório, desde o início do endurecimento das medidas de distanciamento social, quando foram acometidas repentinamente com dezenas de novas regras de segurança para evitar a dispersão da Covid-19 entre seus integrantes. No segmento de óleo e gás, esse movimento impactou mais o ambiente onshore, uma vez que as atividades do setor são consideradas essenciais e não puderam parar em alto mar. Ainda assim, muita coisa mudou para quem trabalha embarcado. De pronto, o desafio extra da comunicação foi alcançar todos os públicos com urgência, de forma criativa e permanente. Mas o que aprendemos de lá para cá?
A comunicação durante a quarentena precisou ser ainda mais transparente. Os funcionários esperavam que a empresa se posicionasse e adotasse uma postura ativa e apoiadora, fosse para apresentar de que forma estava suportando as comunidades onde atua, sozinhas ou em parceria com o poder público; ou para mostrar como a doença estava sendo acompanhada e controlada pela área médica entre seus integrantes. Uma pesquisa da Kantar (Covid-19 Barometer), realizada em 30 países, incluindo o Brasil, apontou que a maioria dos consumidores ouvidos (75%) acha que as marcas devem informar ao público sobre seus esforços para combater a pandemia; (78%) dos entrevistados pediram que as empresas cuidassem da saúde de seus colaboradores, destacando a preocupação em colocá-los em primeiro lugar.
Apesar da intensidade e do volume de informação, a pandemia nos mostrou, na prática, que o colaborador quer e precisa ser informado. A objetividade da comunicação permaneceu no primeiro plano, mas a atualização precisou ganhar velocidade e frequência. O vírus e suas formas de dispersão na sociedade geraram uma demanda por informação, ora por curiosidade, ora por preocupação, e acionou um alerta cuja discussão se acentuou mais nos últimos anos: uso de fontes confiáveis e aumento da desinformação. Foi o momento para a comunicação formal e oficial da empresa ganhar corpo e ocupar espaço, reforçando seu papel enquanto serviço, inclusive como agente mitigador de medos e inseguranças. Foi hora da alta liderança estar mais presente, próxima e disponível para o grande público, talvez como nunca.
Muitas empresas aderiram ao uso de novas ferramentas de comunicação interna especialmente por conta do home office, como disponibilização de chats, videoconferências e outras plataformas. Uma pesquisa da startup catarinense Social Base (Os erros e os acertos do home office na pandemia) mostra que apenas (24,54%) delas não aderiram a nenhum novo canal. No topo dessa lista aparece o Microsoft Teams como o instrumento mais utilizado (38,64%). Essas ferramentas ganharam uma dupla responsabilidade: de comunicar e de aproximar.
Já era claro que fatos e resultados eram a base de qualquer plano, mas especialmente em um momento de negacionismos à ciência, dispersão de fake news e informações sem procedência, a cultura de dados se fez trivial. Acompanhar a propagação da doença internamente na empresa, as tratativas do caso a caso, se guiando por uma inteligência analítica serviu de termômetro para intensificar esse ou aquele assunto, consolidando a urgência de determinada pauta em detrimento de outra. Essa cultura de dados foi o norteador do tom de comunicações importantes, foi ela que indicou mais claramente se era preciso mais rigidez na fala; mais provocação para engajamento; mais presença dos líderes no jogo ou estar mais alerta, por exemplo.
A comunicação corporativa sempre buscou estar próxima da alta liderança e ser estabelecida de forma estratégica. Esses seis meses de pandemia provaram que este é o local em que ela deve estar independentemente do cenário, com Coronavírus ou sem ele. Ela precisa ser direta com os principais executivos, em especial em momentos de crise; demanda velocidade e necessita estar capilarizada por todas as áreas da organização, sendo uma escuta ativa e proativa, antecipando dúvidas, receios ou quaisquer movimentos dos colaboradores. Trata-se de um instrumento de inteligência.
A comunicação precisa ser parceira. Parceira de porta-vozes, dos funcionários e seus principais clientes internos e por isso, precisa ser entendida como uma grande facilitadora. A pandemia destacou de forma amplificada esse papel enquanto solucionadora de problemas, é claro, que não de forma isolada, mas como tática. Ela foi elevada a outro nível e as companhias que já haviam entendido que comunicar precisava ser estratégico tiveram destaque, colocando-a em prática com posição de protagonismo. Aquelas que permaneceram com a ideia de que comunicar é apenas e simplesmente fazer brinde, arte de camisa, comunicado por e-mail e evento, muito provavelmente ficaram para trás e tiveram mais problemas no meio do caminho, ou melhor, ainda devem estar enfrentando-os com maior fragilidade.
Se esse tal ‘novo normal’ urge por informação, a qualidade deste conteúdo precisa vir primeiro. Não faz mais sentido encher a caixa de e-mail do seu público de interesse com comunicações que, como mencionei lá em cima, são para evidência e não têm propósito. Comunicação com propósito gera conversas e o motivo é simples, há uma razão em voga por trás dela, há algo novo a ser apresentado, de relevância, recente e importante. Se o conteúdo não foi consumido, muito provavelmente ele não é novo, não teve relevância ou não tem reconhecimento de importância pela audiência. Fazer esta curadoria, segmentando o conteúdo e analisando criticamente se ele tem propósito ou é apenas para evidência, é papel fundamental da área de comunicação.
O comportamento de uso da internet foi afetado drasticamente nos últimos meses. Nesse período de novos hábitos e ultra digitalização das relações e do trabalho, os conteúdos audiovisuais tiveram destaque ainda maior que antes. Quem diria em janeiro desse ano que viveríamos imersos em tantas lives? O aumento repentino do tráfego online chegou a fazer com que empresas como YouTube, Netflix, Facebook fossem pressionadas a reduzir a qualidade dos vídeos transmitidos na Europa. De acordo com relatório feito no início da pandemia pela consultoria canadense Sandvine, o streaming é agora responsável por (58%) de todo o tráfego de internet. O levantamento também encontrou grandes aumentos de consumo de conteúdo por videoconferência, conexões VPN e jogos desde o início da pandemia.
Uma pesquisa do Google (New Behavior due to Covid-19) aponta um crescimento médio de 450% das buscas diárias por lives e um incremento de 36% nos gastos com serviços de streaming no mundo em decorrência da realidade imposta pelo Coronavírus. Se conteúdo audiovisual já era uma tendência em 2019, seu uso tornou-se uma realidade corriqueira este ano. A discussão agora é como utilizá-lo e não mais por que investir neste formato.
Os últimos seis meses nos deixaram lições importantes e consolidaram novos hábitos de consumo de informação. Comunicação com propósito não apenas é uma evidência por si só, mas uma ferramenta para geração de valor, retenção de talentos e impacto direto na reputação e nos resultados financeiros. Definitivamente, nem o mundo, nem o universo da Comunicação serão os mesmos depois dessa pandemia, e essa clareza poderá ser um diferencial competitivo no médio-prazo, especialmente no setor de energia, que se vê cada vez mais pressionado a acelerar sua transição nas próximas décadas e se deparará com desafios grandes de mudanças culturais, na sociedade e na organização, e do seu negócio.
Sobre o autor: André Luiz Barros, Corporate Communication Manager at Ocyan
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Nova coluna
A pandemia de Covid-19 impactou empresas de todos os segmentos no mundo todo. Neste momento, em muitas companhias, a comunicação corporativa integrou ativamente os comitês de tomada de decisões e ocupou um lugar de protagonismo, em especial para combate massivo à desinformação e fake news. Pensando nisso, a revista TN Petróleo, que sempre teve seu olhar para o tema dentro do nosso setor, lança a partir de hoje, uma coluna exclusiva sobre o assunto.
Os textos abordarão temas gerais da comunicação organizacional interna e externa; relacionamento com imprensa; redes sociais e marketing digital; reputação e imagem e assuntos de discussão mais recente como cultura e marca; propósito e employer branding.
O novo espaço será editado por Lia Medeiros (foto), diretora de Comunicação, Sustentabilidade e Pessoas da TN Petróleo, e assinado pelo jornalista André Luiz Barros, que há 12 anos trabalha com comunicação corporativa e atualmente acumula o cargo de gerente de comunicação em uma empresa do setor de óleo e gás.
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