Segundo o Sindnaval-AM, a dificuldade em inserir a inovação tecnológica na rotina de trabalho está na insegurança de investir.
Priscila Caldas, Jornal do CommercioApesar de ser considerado como o segundo maior polo do Brasil em relação a volumes produtivos, com faturamento anual superior a R$250 milhões, o setor naval do Amazonas evidencia contrastes estruturais e mostra que está longe do desenvolvimento tecnológico. Atualmente, apenas 5% do total de 104 estaleiros instalados no Estado utilizam tecnologia industrial inovadora, com equipamentos automatizados. O problema, segundo o Sindicato da Indústria da Construção Naval, Náutica, Offshore e Reparos do Amazonas (Sindnaval-AM ), está na falta de políticas públicas que incentivem o acesso aos financiamentos bancários, aos atrasos nas tratativas da implementação do polo naval e nas dificuldades para a qualificação da mão de obra.
O diretor do Sindnaval-AM, Ivo Araújo, afirma que os estaleiros investem em maquinário e qualificação dos trabalhadores. Mas, mesmo assim, nos últimos 30 anos pouca coisa avançou no processo de fabricação das embarcações que ainda hoje são produzidas de forma manual, ou seja, artesanal.
Segundo Araújo, a dificuldade em inserir a inovação tecnológica na rotina de trabalho está na insegurança de investir sem visualizar um cenário econômico promissor. “O investimento em maquinário exige a capacitação do trabalhador porque é ele quem vai manusear o equipamento. É preciso oferecer treinamento. Porém, o setor não tem demanda para fazer tal investimento. Precisamos que o governo do Estado se empenhe junto ao setor privado para captar serviços aos estaleiros”, disse. “A ‘luz no fim do túnel’ é a mudança do governo federal e a demanda que possivelmente será direcionada à região Norte por meio do Arco Norte para o transporte do agronegócio. Porém, isso depende de uma política social mais atuante do governo do Amazonas”, completou.
De acordo com o gerente de produção e projetos do Estaleiro Bibi Eireli, Josinaldo Soares, a longo prazo a metodologia de fabricação das embarcações teve poucas mudanças. Soares relata que a empresa sempre se preocupou em inovar o processo de fabricação e uma das tentativas foi a aquisição de um maquinário orçado em aproximadamente R$20 milhões. Entre os equipamentos estão: máquinas de plasma, de corte e dobra, dentre outros usados para tratamento de superfície das chapas de aço.
O problema, é que por falta de novos contratos e possibilidades de manutenção, os equipamentos estão parados no pátio do estaleiro. “O investimento para alcançar a inovação é alto, o que demanda uma projeção de contratos para obras futuras, o que não existe hoje. Temos uma máquina de plasma que nunca foi usada e está parada. Também temos duas máquinas de corte e dobra, além de outras para tratamento de superfície de chapa de aço. Mas, não conseguimos investir sem visualizar retorno à frente. Ainda estamos pagando alguns equipamentos”, relatou.
O Estaleiro Bibi ainda tentou investir em uma linha de montagem, o que segundo Soares representa a automação de parte do processo de fabricação da embarcação. O maquinário custa R$10 milhões. “O fornecedor até facilita a venda. Esse conjunto de equipamentos resultaria na economia na mão de obra. Mas, qual a garantia que teremos para honrar esse compromisso?”, questionou Soares.
O gerente comercial do Estaleiro Bibi, Alessandro Beraldo, também considera a importância do apoio do governo estadual na viabilização de parcerias com segmentos como o das empresas de navegação a partir da renovação da frota, o que resultaria em demanda ao setor naval. “As embarcações são antigas, muitas são de madeira e precisam ser renovadas para chapa de aço, que é mais seguro e confortável. Também falta apoio para o pessoal da navegação que não consegue financiar uma embarcação”, avaliou.
Atualmente, a produção do estaleiro atende às solicitações do Exército, da Polícia Militar Ambiental, ao Ministério da Saúde e ao sistema Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (Fieam). O tempo de fabricação de uma balsa de carga de 600 toneladas é de aproximadamente 40 dias. Enquanto uma embarcação motorizada, que é um empurrador, leva em torno de oito meses para ser entregue. Por meio de nota, a assessoria de comunicação do governo do Estado informou que aguarda o desembaraço das ações no âmbito da Justiça que suspenderam a execução do projeto do polo naval, mas que está buscando alternativas para garantir a estruturação de um plano de logística que contemplará o setor de forma integrada. Na série de oficinas de trabalho realizada em abril, foram apresentadas propostas dentro de um Plano Estratégico de Infraestrutura com discussões sobre o setor hidroviário, na estruturação de uma Nova Matriz Econômica para o Estado do Amazonas. Essas propostas serão sistematizadas e apresentadas posteriormente para o conjunto da sociedade, e depois para os possíveis investidores.
Beconal avança em tecnologia e agiliza produção Em um outro cenário, bem contrastante com o vivenciado em 95% dos estaleiros no Amazonas, estão as empresas que dispõem dos maquinários tecnológicos mais avançados, como é o caso do Beconal Bertolini Construção Naval da Amazônia Ltda.
O gerente industrial do Beconal Bertolini Construção Naval da Amazônia Ltda., Flávio Silveira, conta que desde que foi idealizado, o estaleiro foi projetado com o que havia de inovação no segmento de engenharia naval. O Beconal foi implantado como indústria há 5 anos. No método de fabricação, o estaleiro utiliza a metodologia de processamento de células de produção, uma teoria que segundo Silveira, também é usada nas empresas do Distrito Industrial (DI), que permite que o trabalho aconteça em linha de produção ao mesmo tempo em que viabiliza a customização do produto. “Se em algum momento decidimos mudar a produção de um produto conseguimos alterar a linha com o mínimo de intervenção possível”, explicou.
As peças das embarcações são fabricadas em pedaços, simultaneamente, em linhas de produção distintas. Logo após, as peças são montadas até darem origem à embarcação. “Cada pedaço é fabricado ao mesmo tempo e depois são montados. São estações especializadas. O projeto é adaptado para ter capacidade de produção”, disse.
A empresa conta com seis galpões onde as embarcações são confeccionadas. Um sétimo galpão está em construção e deve ser inaugurado até o mês de julho deste ano. Quanto aos maquinários, o Beconal utiliza guindastes; dois robôs de plasma que cortam as chapas e também retrabalham as sucatas; além de imprimirem o desenho do projeto na chapa. “Hoje, os desenhos que circulam na linha de produção não precisam mais serem interpretados porque já estão impressos na chapa. O operário só terá que executar. Ganhamos na produtividade porque ele não precisará medir nada. Podemos estimar que os investimentos alcançaram cerca de R$40 milhões em maquinário”, frisou.
Em 2006, o Beconal fabricava uma embarcação em nove meses e hoje, a empresa entrega quatro balsas mensalmente. O empurrador demorava cerca de um ano e meio para ser fabricado e atualmente é concluído um empurrador a cada três meses. funcionários e não sofreu impactos relevantes com a crise econômica nacional. Não houve demissões em massa.
Fale Conosco
21