Política

Mantega 'vence' Graça no reajuste da gasolina

Reajuste terá terá impacto pequeno na inflação.

Valor Econômico
02/12/2013 13:19
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O duplo resultado da reunião do Conselho de Administração da Petrobras, que definiu, na sexta-feira (29), o aumento dos combustíveis abaixo da expectativa de mercado e a decisão de não divulgação da fórmula que vai orientar a nova política de preços da estatal, indica que a presidente da empresa, Graça Foster, "perdeu" parte do embate para o ministro da Fazenda, Guido Mantega, avaliam analistas ouvidos pelo 'Valor'.
O reajuste de 4% da gasolina e de 8% do diesel nas refinarias terá impacto pequeno na inflação - entre 0,10 e 0,16 ponto percentual, permitindo que o IPCA encerre o ano abaixo dos 5,84% de 2012. Para os consumidores, a decisão, anunciada na sexta-feira à noite, significa alta de 2% a 3% da gasolina e de 4% a 5% do diesel nas bombas dos postos. O aumento de preços também não deve trazer grandes mudanças para o fluxo de caixa da estatal. Apenas uma parte da defasagem dos preços internos será recomposta - a Petrobras ainda continuará a subsidiar importações de diesel e gasolina. Enquanto as receitas se mantém menores que os investimentos, a petrolífera tem que captar cada vez mais recursos. Isso preocupa: a dívida líquida já chegou a R$ 193 bilhões.
Analistas do mercado previam a necessidade de reajuste de pelo menos 6% na gasolina e 10% no diesel. Na avaliação de Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE), o resultado da reunião aponta para uma falta de autonomia da Petrobras diante do Ministério da Fazenda. "Foi um gol do Guido Mantega, e a Graça perdeu de 10 a zero. O viés de controle da inflação prevaleceu", diz Pires. Um executivo de um grande banco estrangeiro tem opinião parecida. "No frigir dos ovos a empresa leva o mesmo que tinha antes, que é uma convergência de longo prazo, mas com entrelinhas ruins".
Segundo ele, a presidente da Petrobras sai enfraquecida e perde credibilidade junto ao mercado, quando antes se pensava que ela tinha as graças da presidente Dilma Rousseff. "Fica claro com essa desalavancagem em dois anos que a Petrobras está afrouxando critérios, subordinada ao horizonte eleitoral no momento em que a taxa de juros sinaliza que vai parar de subir. É claro que não vai ter novos aumentos até a eleição. Seria melhor não ter dito nada", completa.
Para esse executivo, em 2015, a companhia só terá um ano para corrigir a alavancagem, o que exigiria um "mega" aumento de preços. "Com uma fórmula a companhia teria previsibilidade que fosse em 18, 24 ou 36 meses. Agora acredito que a ação pode cair cerca de 10% na segunda-feira (hoje). Isso também vai reverberar nos mercados de câmbio e juros. A pequena melhora de confiança em processo de construção com o leilão de Libra e dos aeroportos vai por água abaixo".
A polêmica envolvendo governo e Petrobras também revelou desinformação, em Brasília, sobre a estrutura de custos do setor de petróleo, o mais globalizado do planeta. Causou estranheza entre analistas de grandes bancos e consultores a informação publicada pelo Valor de que a presidente Dilma não aceita que os preços dos combustíveis no Brasil sejam corrigidos pela cotação internacional tendo em vista que o petróleo é extraído e refinado no Brasil por trabalhadores que recebem em reais.
"Isso está me preocupa. Achava que o governo concordava que o valor estratégico do petróleo é que ele é nosso, mas um valor dado pelo mercado internacional. É uma premissa fundamental. Mas quando o preço doméstico passa a depender do nível de alavancagem e de onde é produzido, a Petrobras não vai ser mais uma empresa de petróleo, e isso é desvalorizar totalmente a companhia", afirma um executivo do setor.
A preocupação faz sentido. No setor petrolífero tudo funciona em dólares e ter preços atrelados ao do petróleo garante um "hedge" natural para as companhias. Os navios de apoio, plataformas de produção e as sondas de perfuração são alugadas em dólares (o aluguel de uma sonda varia de US$ 800 mil a US$ 1 milhão por dia, e um poço leva até 60 dias para ser concluído). O mesmo acontece com equipamentos como turbinas geradoras de energia das plataformas, cabeças de poço submarinas e até o aço utilizado pelos estaleiros brasileiros para construir as plataformas flutuantes de produção capazes de armazenar cerca de 2 milhões de barris no mar, as FPSOs. Essas plataformas, verdadeiras cidades flutuantes, custam em média US$ 1 bilhão, sem contar os sistemas submarinos que conectam nelas os poços no fundo do mar.
Do investimento total da Petrobras, cerca de 60% é dolarizado. Ironicamente, os equipamentos fabricados no Brasil também têm preço corrigido pelo dólar com o agravante de, muitas vezes, serem mais caros do que os do mercado externo. Outra interferência do dólar no setor pode ser vista nos royalties e na Participação Especial (PE). Esses tributos sobre a produção do petróleo no país são cobrados com base na cotação internacional e têm seus valores convertidos para real. Até outubro, o Brasil arrecadou R$ 24,5 bilhões com essas cobranças. Desse total, a União ficou com R$ 9,3 bilhões. Pouco mais de R$ 1 bilhão foi depositado no Fundo Social.
O Decreto que define os critérios de cobrança (2.705/98) estabelece, em seu quarto capítulo, que "o preço mínimo do petróleo extraído de cada campo será fixado pela ANP com base no valor médio mensal de uma cesta-padrão composta de até quatro tipos de petróleo similares cotados no mercado internacional". O decreto diz também que "os preços de venda do petróleo, quando expressos em moeda estrangeira, serão convertidos para a moeda nacional pelo valor médio mensal das taxas de câmbio oficiais diárias para a compra da moeda estrangeira, fixadas pelo Banco Central do Brasil para o mês em que ocorreu a venda".
Os preços do petróleo não são baseados no custo de produção na Arábia Saudita, da Rússia, Angola, Nigéria, Noruega ou Estados Unidos. O conjunto de países que forma a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) - responsável hoje por um terço da oferta mundial e do qual faz parte a vizinha Venezuela - estabelece preços de venda de seus associados e volumes de produção, mas um outro grupo de países que são grandes produtores e não fazem parte da Opep, como a Rússia, também influi nos preços mundiais.
Outro fator poderoso de composição de preços no setor é o de mercado: a qualquer sinal de restrição de oferta ou um temor de que ela ocorra no futuro, os preços sobem. E quando aparecem sinais de restrições no consumo por queda de poder aquisitivo dos grandes consumidores e desaceleração econômica, eles caem. Por sua vez, aumentos nos preços do petróleo servem de incentivo para as companhias colocarem em produção projetos menos rentáveis quando os preços estão baixos. Com mais encomendas, a cadeia de fornecedores enfrenta gargalos globalmente e os preços sobem.
Na maioria dos países - e uma exceção é a Venezuela onde o litro da gasolina custa igual a uma bala - o preço dos combustíveis segue o valor da commodity. Em algumas nações são criados fundos para evitar flutuações bruscas. Até o momento, todas as tendências apontam para aumento do consumo mundial de petróleo, (hoje de 92,1 milhões de barris por dia) com a entrada no mercado consumidor de populações com renda ascendente de países emergentes como Brasil, Índia e China.
A produção se tornou mais cara porque o petróleo mais fácil de ser extraído se esgotou e a oferta, quando se olha de 30 a 40 anos à frente, parece ser menor que a demanda, salvo mudança radical da matriz energética mundial causada por novas tecnologias como os híbridos. O petróleo que ainda não se esgotou está hoje em águas ultraprofundas do Brasil, África e Golfo do México ou nas geleiras do Ártico. Técnicas de exploração e produção de "shale gas", que antes não eram comerciais nem tecnicamente viáveis, trouxeram fôlego novo principalmente ao mercado dos Estado Unidos. Mas ainda não está claro a longevidade dessas reservas, sem mencionar os custos ambientais envolvidos nesse tipo específico de exploração.

O duplo resultado da reunião do Conselho de Administração da Petrobras, que definiu, na sexta-feira (29), o aumento dos combustíveis abaixo da expectativa de mercado e a decisão de não divulgação da fórmula que vai orientar a nova política de preços da estatal, indica que a presidente da empresa, Graça Foster, "perdeu" parte do embate para o ministro da Fazenda, Guido Mantega, avaliam analistas ouvidos pelo 'Valor'.

O reajuste de 4% da gasolina e de 8% do diesel nas refinarias terá impacto pequeno na inflação - entre 0,10 e 0,16 ponto percentual, permitindo que o IPCA encerre o ano abaixo dos 5,84% de 2012. Para os consumidores, a decisão, anunciada na sexta-feira à noite, significa alta de 2% a 3% da gasolina e de 4% a 5% do diesel nas bombas dos postos. O aumento de preços também não deve trazer grandes mudanças para o fluxo de caixa da estatal. Apenas uma parte da defasagem dos preços internos será recomposta - a Petrobras ainda continuará a subsidiar importações de diesel e gasolina. Enquanto as receitas se mantém menores que os investimentos, a petrolífera tem que captar cada vez mais recursos. Isso preocupa: a dívida líquida já chegou a R$ 193 bilhões.

Analistas do mercado previam a necessidade de reajuste de pelo menos 6% na gasolina e 10% no diesel. Na avaliação de Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE), o resultado da reunião aponta para uma falta de autonomia da Petrobras diante do Ministério da Fazenda. "Foi um gol do Guido Mantega, e a Graça perdeu de 10 a zero. O viés de controle da inflação prevaleceu", diz Pires. Um executivo de um grande banco estrangeiro tem opinião parecida. "No frigir dos ovos a empresa leva o mesmo que tinha antes, que é uma convergência de longo prazo, mas com entrelinhas ruins".

Segundo ele, a presidente da Petrobras sai enfraquecida e perde credibilidade junto ao mercado, quando antes se pensava que ela tinha as graças da presidente Dilma Rousseff. "Fica claro com essa desalavancagem em dois anos que a Petrobras está afrouxando critérios, subordinada ao horizonte eleitoral no momento em que a taxa de juros sinaliza que vai parar de subir. É claro que não vai ter novos aumentos até a eleição. Seria melhor não ter dito nada", completa.

Para esse executivo, em 2015, a companhia só terá um ano para corrigir a alavancagem, o que exigiria um "mega" aumento de preços. "Com uma fórmula a companhia teria previsibilidade que fosse em 18, 24 ou 36 meses. Agora acredito que a ação pode cair cerca de 10% na segunda-feira (hoje). Isso também vai reverberar nos mercados de câmbio e juros. A pequena melhora de confiança em processo de construção com o leilão de Libra e dos aeroportos vai por água abaixo".

A polêmica envolvendo governo e Petrobras também revelou desinformação, em Brasília, sobre a estrutura de custos do setor de petróleo, o mais globalizado do planeta. Causou estranheza entre analistas de grandes bancos e consultores a informação publicada pelo Valor de que a presidente Dilma não aceita que os preços dos combustíveis no Brasil sejam corrigidos pela cotação internacional tendo em vista que o petróleo é extraído e refinado no Brasil por trabalhadores que recebem em reais.

"Isso está me preocupa. Achava que o governo concordava que o valor estratégico do petróleo é que ele é nosso, mas um valor dado pelo mercado internacional. É uma premissa fundamental. Mas quando o preço doméstico passa a depender do nível de alavancagem e de onde é produzido, a Petrobras não vai ser mais uma empresa de petróleo, e isso é desvalorizar totalmente a companhia", afirma um executivo do setor.

A preocupação faz sentido. No setor petrolífero tudo funciona em dólares e ter preços atrelados ao do petróleo garante um "hedge" natural para as companhias. Os navios de apoio, plataformas de produção e as sondas de perfuração são alugadas em dólares (o aluguel de uma sonda varia de US$ 800 mil a US$ 1 milhão por dia, e um poço leva até 60 dias para ser concluído). O mesmo acontece com equipamentos como turbinas geradoras de energia das plataformas, cabeças de poço submarinas e até o aço utilizado pelos estaleiros brasileiros para construir as plataformas flutuantes de produção capazes de armazenar cerca de 2 milhões de barris no mar, as FPSOs. Essas plataformas, verdadeiras cidades flutuantes, custam em média US$ 1 bilhão, sem contar os sistemas submarinos que conectam nelas os poços no fundo do mar.

Do investimento total da Petrobras, cerca de 60% é dolarizado. Ironicamente, os equipamentos fabricados no Brasil também têm preço corrigido pelo dólar com o agravante de, muitas vezes, serem mais caros do que os do mercado externo. Outra interferência do dólar no setor pode ser vista nos royalties e na Participação Especial (PE). Esses tributos sobre a produção do petróleo no país são cobrados com base na cotação internacional e têm seus valores convertidos para real. Até outubro, o Brasil arrecadou R$ 24,5 bilhões com essas cobranças. Desse total, a União ficou com R$ 9,3 bilhões. Pouco mais de R$ 1 bilhão foi depositado no Fundo Social.

O Decreto que define os critérios de cobrança (2.705/98) estabelece, em seu quarto capítulo, que "o preço mínimo do petróleo extraído de cada campo será fixado pela ANP com base no valor médio mensal de uma cesta-padrão composta de até quatro tipos de petróleo similares cotados no mercado internacional". O decreto diz também que "os preços de venda do petróleo, quando expressos em moeda estrangeira, serão convertidos para a moeda nacional pelo valor médio mensal das taxas de câmbio oficiais diárias para a compra da moeda estrangeira, fixadas pelo Banco Central do Brasil para o mês em que ocorreu a venda".

Os preços do petróleo não são baseados no custo de produção na Arábia Saudita, da Rússia, Angola, Nigéria, Noruega ou Estados Unidos. O conjunto de países que forma a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) - responsável hoje por um terço da oferta mundial e do qual faz parte a vizinha Venezuela - estabelece preços de venda de seus associados e volumes de produção, mas um outro grupo de países que são grandes produtores e não fazem parte da Opep, como a Rússia, também influi nos preços mundiais.

Outro fator poderoso de composição de preços no setor é o de mercado: a qualquer sinal de restrição de oferta ou um temor de que ela ocorra no futuro, os preços sobem. E quando aparecem sinais de restrições no consumo por queda de poder aquisitivo dos grandes consumidores e desaceleração econômica, eles caem. Por sua vez, aumentos nos preços do petróleo servem de incentivo para as companhias colocarem em produção projetos menos rentáveis quando os preços estão baixos. Com mais encomendas, a cadeia de fornecedores enfrenta gargalos globalmente e os preços sobem.

Na maioria dos países - e uma exceção é a Venezuela onde o litro da gasolina custa igual a uma bala - o preço dos combustíveis segue o valor da commodity. Em algumas nações são criados fundos para evitar flutuações bruscas. Até o momento, todas as tendências apontam para aumento do consumo mundial de petróleo, (hoje de 92,1 milhões de barris por dia) com a entrada no mercado consumidor de populações com renda ascendente de países emergentes como Brasil, Índia e China.

A produção se tornou mais cara porque o petróleo mais fácil de ser extraído se esgotou e a oferta, quando se olha de 30 a 40 anos à frente, parece ser menor que a demanda, salvo mudança radical da matriz energética mundial causada por novas tecnologias como os híbridos. O petróleo que ainda não se esgotou está hoje em águas ultraprofundas do Brasil, África e Golfo do México ou nas geleiras do Ártico. Técnicas de exploração e produção de "shale gas", que antes não eram comerciais nem tecnicamente viáveis, trouxeram fôlego novo principalmente ao mercado dos Estado Unidos. Mas ainda não está claro a longevidade dessas reservas, sem mencionar os custos ambientais envolvidos nesse tipo específico de exploração.

 

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