Valor Econômico
A indústria fornecedora de peças e equipamentos para exploração e produção de petróleo ficou preocupada com o rumo dado pelo governo para a futura lavra dos hidrocarbonetos da camada pré-sal. Empresários e executivos ouvidos pelo Valor manifestaram especial apreensão com o trecho dos projetos enviados pelo governo ao Congresso Nacional que elege a Petrobras operadora única dos futuros blocos exploratórios de petróleo e gás, embora reconheçam que a estatal tem sido até hoje uma estimuladora da indústria nacional na condição quase que de compradora única.
"A gente pode dizer, no geral, que, se elimina a competitividade, não é bom", afirma o diretor-geral da Organização Nacional da Indústria do Petróleo (Onip), Eloy Fernández y Fernández. Ele disse que ainda é cedo para emitir opiniões mais profundas, mas ressaltou que quando uma empresa tem vários clientes, suas condições de atuação no mercado são sempre melhores.
Segundo Fernández, até para permitir que os fabricantes brasileiros de componentes para a indústria do petróleo atinjam capacidade para competir internacionalmente, é importante que esses fabricantes tenham condições de fornecer domesticamente para várias empresas com atuação internacional. Ele disse que o fato de a Petrobras ser uma empresa globalizada, que faz suas compras segundo padrões internacionais, é um ponto positivo a ser considerado neste contexto.
Marcelo Bueno, diretor-executivo para a América Latina da empresa alemã Schulz, fabricante de tubos para a indústria offshore, com quatro fábricas no Brasil, disse que para o desenvolvimento da indústria a concentração nas mãos de uma só operadora "pode trazer limitações". Segundo ele, a Petrobras tem limitações de pessoal e de processos para qualificar fornecedores, característica que tende a se exacerbar com a concentração de todas as áreas do pré-sal em suas mãos.
"Vai ser criado um gargalo que é próprio da burocracia interna da Petrobras. Não estou seguro que seja bom para o Brasil e para a cadeia de fornecedores", afirmou. Segundo Bueno, atualmente é mais fácil qualificar uma unidade localizada no exterior do que uma fábrica nacional para fornecer à estatal brasileira do petróleo. "Para nós é mais interessante que haja outros participantes (do mercado) porque nós já estamos qualificados em todos eles", disse.
O empresário Raul Sanson, presidente da PWR Mission, tradicional fornecedora de válvulas e bombas centrífugas, e vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), disse que no momento atual, a quase totalidade das compras feitas pelo setor de petróleo aos fornecedores brasileiros vem da Petrobras, direta ou indiretamente. Segundo ele, as empresas estrangeiras que já estão produzindo no país têm dado preferência ao mercado externo, até pelas condições favoráveis da taxa de câmbio.
O problema da regulamentação do pré-sal, para o empresário, é que ela está atrasando a continuidade do desenvolvimento do setor, atrasando novas encomendas da Petrobras ou de outros participantes do mercado. Sanson ressaltou que desde a oitava rodada de licitações da Agência Nacional do Petróleo (ANP), realizada e depois suspensa, que o andamento normal da indústria vem sendo travado. Com a regulamentação diferente para o pré-sal, ele avalia que vai demorar muito até que os investidores voltem a se sentir seguros para retomar os investimentos, atrasando ainda mais o ritmo de encomendas aos fornecedores.
Tanto Fernández quanto Bueno e Sanson concordaram que se não for feita uma política industrial que assegure à indústria nacional competitividade em relação aos concorrentes externos, o Brasil estará deixando escapar mais uma vez a oportunidade de tornar-se um membro competitivo da indústria de petróleo como um todo. Para Fernández, o foco das ações do governo deve ser nas questões tributárias, na disponibilidade de financiamento e de tecnologia e na desburocratização.
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