Redação/Assessoria Fapesp
A FAPESP e a IBM realizaram em 12 de março, no auditório da Fundação, um evento de apresentação da chamada de propostas que visa selecionar parceiros para a constituição do Centro de Pesquisa em Engenharia em Inteligência Artificial (IA).
O objetivo do novo centro, apoiado pela FAPESP no âmbito do programa Centros de Pesquisa em Engenharia (CPE), será desenvolver pesquisa disruptiva, com potencial para promover avanços científicos significativos na área e com aplicações em setores industriais estratégicos. Para isso, terá financiamento de US$ 1 milhão por ano, dos quais US$ 500 mil serão aportados pela FAPESP e o mesmo valor pela IBM, por um período de até 10 anos.
“Esperamos receber propostas voltadas ao desenvolvimento de pesquisa avançada que seja mundialmente competitiva e que contemple a formação de recursos humanos em inteligência artificial. Há uma grande demanda por pesquisadores nessa área tanto no Brasil como em outros lugares do mundo”, disse Carlos Henrique de Brito Cruz (foto), diretor científico da FAPESP, durante o evento.
As propostas poderão ser encaminhadas até o dia 15 de abril de 2019 por grupos de pesquisadores ligados a universidade ou instituição de pesquisa sediada no Estado de São Paulo e deverão ter uma componente básica e outra aplicada.
O programa de pesquisa do centro selecionado deverá incluir pesquisa básica para criar conhecimento competitivo internacionalmente, tendo em vista a possibilidade de aplicações em setores como recursos naturais (óleo e gás, mineração), agronegócio (inclusive genômica e biotecnologia), meio ambiente, setor financeiro e de saúde. O centro também poderá desenvolver estudos que explorem as implicações socioeconômicas da inteligência artificial nesses segmentos.
“As propostas não devem cobrir obrigatoriamente todas essas áreas. Queremos receber programas de pesquisa bem focados”, disse Luiz Nunes de Oliveira, coordenador adjunto da diretoria científica da FAPESP para Programas Especiais e Colaborações em Pesquisa.
Alguns dos focos das propostas deverão ser o desenvolvimento de algoritmos avançados para expandir as capacidades de aprendizado de máquina e aprendizado profundo (deep learning) e de novas aplicações para uso profissional da inteligência artificial em setores industriais.
Completam os temas de interesse a criação de sistemas com mais alto nível de raciocínio, a aceleração da disponibilidade de ferramentas que operem em língua portuguesa e a exploração da área para prover benefícios econômicos e sociais para um maior número de pessoas, países e empresas.
“Queremos propostas de projetos voltados ao desenvolvimento de técnicas que permitam expandir e avançar a fronteira do conhecimento em inteligência artificial, e não direcionadas à aplicação de técnicas já dominadas em problemas que até então não foram usadas”, disse Ulisses Mello, diretor da IBM Research Brasil.
O centro será a primeira instituição na América Latina a integrar a IBM AI Horizons Network, rede lançada em 2016 pela empresa para promover a integração e a colaboração com as principais universidades e instituições de pesquisa no mundo para acelerar a aplicação da inteligência artificial em algumas áreas.
Uma das instituições que integram a rede é o Massachusetts Institute of Technology (MIT), dos Estados Unidos. “A rede tem possibilitado desenvolver um trabalho muito interessante e, inclusive, em parceria com outras empresas”, disse Mello.
Segundo ele, mais de 10 empresas no Brasil já manifestaram interesse em também fazer parcerias em pesquisa com o novo centro. “Será interessante discutir modelos de parceria com outras empresas para fornecer dados, pessoas e recursos que permitam expandir as pesquisas”, disse.
Aplicações industriais
De acordo com Mello, o desenvolvimento da inteligência artificial está entre as quatro áreas estratégicas de pesquisa da IBM. As outras três são a preparação de bases para o futuro da computação, a definição e otimização de cadeias de dados (blockchains) e a transformação de setores industriais por meio da ciência e da inteligência artificial.
Para continuar o desenvolvimento na área e possibilitar expandir sua aplicação industrial, será preciso potencializar avanços na percepção, raciocínio e compreensão de dispositivos computacionais para ajudá-los a lidar com tarefas complexas semelhantes às humanas. Além disso, desenvolver novos hardwares, softwares e algoritmos que tornem a inteligência artificial mais rápida, fácil e capaz de atacar problemas maiores e mais complexos.
Segundo Mello, paralelamente ao avanço da inteligência artificial, será preciso assegurar que os algoritmos não sejam tendenciosos e nem discriminem pessoas por razões de raça, sexo ou classe social na tomada de decisões, como concessão de crédito ou propostas de seguro. “Lançamos um banco de dados com mais de 1 milhão de faces para evitar treinamentos de algoritmos que possam induzir viés”, disse Mello.
No Brasil, os focos das pesquisas feitas nos laboratórios da empresa, situados em São Paulo e no Rio de Janeiro, são justamente os temas de interesse abrangidos na chamada de propostas para a criação do novo centro com a FAPESP.
No setor de óleo e gás, a IBM estabeleceu parcerias com a Shell, Repsol e Galp para usar técnicas de inteligência artificial na análise de conjuntos de dados sísmicos em 3D rapidamente, a fim de avaliar características geológicas de potenciais poços de petróleo.
No setor agrícola, os pesquisadores da empresa têm desenvolvido sistemas de análise de dados que permitirão a agricultores avaliar fatores como umidade, temperatura e riscos de pragas e doenças em suas lavouras, fazer previsões de tempo e de produção e administrar a aplicação de fertilizantes.
“Atualmente, com a pulverização de precisão é possível reduzir em até 90% a quantidade de fertilizantes em uma lavoura”, disse Mello.
Na área da saúde, a IBM tem usado ferramentas avançadas de inteligência artificial para analisar rapidamente imagens médicas e diagnosticar mais precisamente doenças.
“Um simples exame de ressonância magnética gera cerca de 10 mil imagens. Nosso objetivo é desenvolver um sistema que seja capaz de fechar o diagnóstico de um paciente com base na análise das 20 imagens mais importantes em exame desse tipo”, disse Rogério de Paula, gerente na área de Tecnologias em Inteligência Artificial para Tomada de Decisões na Indústria, no laboratório de pesquisa da IBM no Brasil.
E na área de inteligência conversacional – de conversação com computadores e sistemas inteligentes –, os pesquisadores da empresa no Brasil têm se dedicado a aprimorar programas de computador que tentam simular um ser humano na conversação com pessoas (chatbots).
"Os chatbots disponíveis hoje são baseados apenas em perguntas e respostas ou voltados a acatar passivamente ordens, sem realmente saber conversar", disse Claudio Pinhanez, gerente de inteligência conversacional no laboratório de pesquisa da IBM Brasil.
“Nosso foco em pesquisa é o que chamamos de segunda geração de sistemas conversacionais, ou seja, chatbots que sejam capazes realmente de conversar e ter uma linguagem mais rica”, afirmou.
Uma das metas dos pesquisadores é desenvolver uma tecnologia que possibilite aos humanos conversar com vários bots ao mesmo tempo e, em contrapartida, que eles também sejam capazes de falar com um maior número de pessoas simultaneamente.
“A ideia é que, ao planejar uma viagem, uma família possa falar simultaneamente com um bot de uma empresa aérea, com outro de uma agência de viagens e mais outro do serviço turístico da cidade para onde ele pretende ir, por exemplo, para decidir sobre o destino”, disse Pinhanez.
Pesquisa em inteligência artificial em São Paulo
Pinhanez disse ser ele próprio um dos “resultados” do apoio da FAPESP a projetos de pesquisa em inteligência artificial em São Paulo nas últimas três décadas. Em 1990, a Fundação concedeu uma bolsa para ele realizar um estágio de pesquisa no Japão e desenvolver um projeto de pesquisa em inteligência artificial. Na época, era professor da Universidade de São Paulo (USP).
“Naquele tempo, ninguém acreditava em inteligência artificial no meu departamento. Hoje estamos falando na criação de um centro dedicado a essa área”, disse.
Data de 1990 o primeiro projeto apoiado pela FAPESP que aborda um dos temas relacionados à inteligência artificial, as redes neurais artificiais – modelos computacionais inspirados no sistema nervoso central. E o projeto pioneiro de parceria em pesquisa na área entre universidade e empresa financiado pela FAPESP foi iniciado em 1996 por pesquisadores da Escola Politécnica da USP em conjunto com a Petrobras.
"A base construída por meio de projetos e iniciativas baseadas na iniciativa dos pesquisadores em SP nos permite agora ousar mais. O número de projetos em inteligência artificial apoiados pela FAPESP tem aumentado em diferentes modalidades de apoio, como no Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE)", destacou Brito Cruz.
“Nos últimos dois anos, a FAPESP investiu R$ 30 milhões por ano em pesquisa em inteligência artificial. Não é um investimento baixo, mas pode ser maior. O acordo com a IBM para criação de um centro de pesquisa na área nos ajudará a incentivar projetos de longo prazo”, disse o diretor científico da FAPESP.
A chamada de propostas para o centro pode ser acessada em www.fapesp.br/12504. Propostas serão recebidas até 15 de abril.
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