As campanhas eleitorais vão e vêm, mas a Petrobras parece ter ganho uma autonomia nas últimas duas décadas que permitiu manter números consistentes, apesar da interferência política.
Um levantamento feito pelo Valor Data com balanços da Petrobras desde 1995, corrigidos pela inflação, mostra uma mudança significativa na história financeira recente da companhia a partir de 1999.
A data coincide com os primeiros leilões da Agência Nacional do Petróleo, depois da lei de 1997 que acabou com o monopólio da produção e da exploração de petróleo.
A partir de 1999, quando passa a valer na prática a quebra do monopólio, há um ganho visível de eficiência. A relação do faturamento com os custos de produção (a chamada margem bruta, no jargão financeiro) chegou pela primeira vez a 36%: de cada R$ 100 em vendas, sobravam R$ 36 de lucro bruto. A empresa continuou próxima a esse patamar - um avanço significativo em relação aos 22% de 1995 - nos anos seguintes, com variações para cima e para para baixo, mas nunca voltando aos níveis da época do monopólio. No ano passado, a margem foi de 38%.
Outra maneira de olhar a transformação nas contas da empresa é a evolução das despesas administrativas e com vendas no período. Nesse aspecto, também há uma clara mudança de patamar. Em 1995, as despesas representavam quase 17% do faturamento; quatro anos mais tarde, esse índice havia caído pela metade, para perto de 8%, o que foi mantido nos anos seguintes.
A redução das despesas permitiu um aumento no lucro líquido, o dinheiro que sobra para os acionistas: a partir de 2000, o ganho sempre esteve acima dos 10%. Não há, nos números, nenhum sinal do "desmanche" apontado pelo executivo da vez, José Sergio Gabrielli, em confronto com a gestão anterior.
Com a flexibilização do monopólio do petróleo, por meio da Lei 9.478, de 1997, a empresa se livrou de várias amarras, como os subsídios cruzados e controle de preços dos combustíveis. Em 1998, obteve outro importante instrumento por meio do decreto 2.745, que permitiu licitações simplificadas e sua independência com relação à Lei das Licitações.
Com a abertura, a Petrobras passou a ter faturamento dolarizado, com base no preço internacional do barril de petróleo. Com mais liberdade de gestão, conseguiu um salto de produção quando antes o temor era de que a estatal perdesse espaço à partir da chegada de suas concorrentes no seu território. O aumento da produção permitiu elevar exportações dos excedentes de petróleo pesado, que no entanto não evitaram a necessidade de importar óleo leve para permitir a mistura mais econômica para produzir combustíveis em suas refinarias.
A autonomia conquistada permitiu que a Petrobras registrasse mais lucros e mais produtividade combinada com redução de custos da sua pesada estrutura. Longe de perder espaço, consolidou sua posição hegemônica no Brasil e se verticalizou. Em 2002, a companhia anunciou uma política de preços baseada na cotação internacional que faria flutuar, para cima ou para baixo, os preços dos combustíveis no Brasil a cada 15 dias.
O resultado foi que, nos oito anos do governo Fernando Henrique Cardoso, a produção de petróleo, cresceu 109%, comparado a um avanço de 30% no governo Luiz Inácio Lula da Silva.
Tanta liberdade em um mercado onde a Petrobras ainda exercia o monopólio de fato (e não mais de direito), gerou críticas e reclamações, inclusive do atual candidato à Presidência pelo PSDB, José Serra. Em uma entrevista ao jornal "O Globo", em abril de 2002, em que ele criticava a política de preços da Petrobras. Serra era contra a equalização do preço do petróleo com o mercado internacional porque afetava com muita frequência o preço dos combustíveis no Brasil.
Naquela campanha também ficou evidente que nem a política econômica de FHC conseguiu abrir mão de uma participação mais ativa da Petrobras na política de controle da inflação. Esse é outro ponto importante na história da companhia: o infalível apreço dos governos da ocasião em fazer uso dela para interesses políticos ou macroeconômicos. Um exemplo disso no governo FHC são os contratos de suprimento de gás a preços subsidiados para termelétricas prioritárias para tentar evitar, sem sucesso, o racionamento de energia em 2001. Também se conheceu depois as condições de alguns contratos para térmicas em que a estatal assumia todo o risco do negócio, dividindo o lucro (se houvesse) com grupos privados.