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O novo marco legislativo do gás natural – reflexões sobre o PL 6407, por Paulo Valois Pires


18/08/2020 20:45
O novo marco legislativo do gás natural – reflexões sobre o PL 6407, por Paulo Valois Pires Imagem: Divulgação Visualizações: 1091 (0) (0) (0) (0)

Background - Inicialmente apresentado em 24 de setembro de 2013 pelo Deputado Antonio Carlos Mendes Thame, o Projeto de Lei nº 6407/2013, cujo texto atual de 23 de outubro de 2019, proveniente de substitutivo da Comissão de Minas e Energia – CME, tramita em regime de urgência na Câmara dos Deputados, sob a relatoria do Deputado Laércio Oliveira, estando em vias de ser votado pelo Plenário da casa para, em caso de aprovação, ser encaminhado ao Senado.

Numa visão geral, o PL 6407 tem méritos. Se Bismark fosse vivo, talvez ele dissesse que o PL 6406 representa a “arte do possível.”

O PL 6407 foi hábil porque tangencia a espinhosa questão dos serviços locais da distribuição de gás canalizado e empurra para a ANP a regulação de temas não menos complexos, como a regulação do acesso de terceiros a gasodutos de transporte, a cessão compulsória de capacidade e a preferência do proprietário para o uso da sua infraestrutura de transporte.

Ele introduz avanços importantes sobretudo em matéria de transporte de gás natural porque atual Lei do Gás não logrou êxito de trazer investimentos para a infraestrutura de transporte.

Nenhuma concessão de transporte de gás natural foi outorgada sob a égide da atual Lei do Gás. A única experiência que mais se aproximou talvez tenha sido o projeto Guapimirim-Itaboraí da Petrobras.

Isso é um fato.

É claro que, neste particular, o insucesso da atual Lei do Gás tem de ser visto dentro do contexto à época da sua promulgação em 2009, quando a Petrobras detinha participação hegemônica no transporte de gás. Para ser se ter uma ideia, a venda de 90% da NTS foi concluída em 2017, e da TAG, em 2019.

A atual Lei do Gás adotou o regime de concessão para atividades de transporte de gás natural. À época, durante as discussões, o argumento favorável ao regime concessional foi que este traria segurança jurídica para o aporte de investimentos na infraestrutura de transporte.

O transporte de gás é um monopólio natural, uma indústria de rede, que precisa do grid, da infraestrutura para movimentar os volumes (com exceção da movimentação por LNG). Mas, os investimentos não chegaram e não houve expansão da malha dutoviária. O Brasil tem cerca de 40.000 Km de gasodutos, enquanto os Estados Unidos 4,5 milhões.

Portanto, o PL aposta na simplificação do processo de construção e operação de gasodutos de transporte, acabando com o natimorto regime de concessão, que nunca chegou a ser testado.

InstitucionalCom a conversão do PL em lei, a atividade de transporte de gás passará ser objeto de autorização prévia pela ANP, precedida de chamada pública. A construção e a operação e gasodutos de transporte deixam ser regidas pela concessão, passando a ser autorizadas pela ANP, previamente obtido o respectivo licenciamento ambiental.

A concessão é um regime que tem liturgia própria e, no caso do transporte de gás, sempre precedida de licitação.

A autorização, ao contrário, obedece a procedimento mais simples, sem necessidade de licitação. É um ato administrativo discricionário, unilateral e precário, expedida com base no critério de oportunidade e conveniência do Poder Público.

Para mitigar a precariedade, o PL elenca de forma taxativa as hipóteses de revogação da autorização pelo Poder Público, a saber: liquidação, falência, por requerimento da transportadora, desativação das instalações de transporte, além do descumprimento, de forma grave, da nova Lei do Gás, da regulação aplicável, dos contratos de serviços de transporte e dos requisitos de independência e autonomia.

Além disso, há doutrina e jurisprudência estabelecendo a indenização do autorizatário em caso de revogação imotivada, quando a autorização foi dada por prazo certo e determinado e mediante a contrapartida de investimentos.

Assim, o PL 6407 deposita confiança no regime de autorizações para o exercício da atividade de transporte de gás.

Acesso às infraestruturas

O PL 6407 traz uma mudança de orientação significativa quando prevê o acesso não discriminatório e negociado de terceiros a terminais de LNG/REGAS, instalações de estocagem, processamento e tratamento de gás natural, além de gasodutos de escoamento, cujo acesso é atualmente vedado pelo 45 da Lei do Gás.

É bem verdade que a questão do livre acesso de terceiros já passou por idas e vindas desde a edição da Lei do Petróleo em 1997.

Trata-se de conseguir o ponto de equilíbrio entre o direito de acesso e a necessidade investimento com prerrogativas asseguradas aos investidores.

Nesse contexto, o PL também preserva o princípio da preferência do proprietário para uso das próprias instalações, preferência essa a ser definida e regulada pela ANP.

Unbundling

PL entra com força na questão do unbundling societário vedando as chamadas participações cruzadas.

A discussão em torno do unbundling societário ou contábil não é nova.

Ele já havia sido objeto do artigo 65 da Lei do petróleo, que estabeleceu que a Petrobras deveria constituir uma “uma subsidiária com atribuições específicas de operar e construir seus dutos, terminais marítimos e embarcações para transporte de petróleo, seus derivados e gás natural, ficando facultado a essa subsidiária associar-se, majoritária ou minoritariamente, a outras empresas.”

O assunto também foi examinado pela Lei do Gás que, em seu artigo 3º, parágrafo 3º, impôs restrições ao exercício de outras atividades pelas transportadoras de gás, exceto as de estocagem, transporte de biocombustíveis e construção/operação de terminais.

Portanto, a ideia que prevaleceu tanto na Lei do Petróleo quanto na atual Lei do Gás foi que a transportadora deve agir com independência e autonomia, sem participar de outras atividades que possam gerar conflito de interesse ou limitem a concorrência.

Então, com o PL 6407, a questão unbundling é aprofundada. Ele veda a relação societária, direta ou indireta, de controle ou de coligação, entre transportadores e empresas que atuam na exploração, desenvolvimento e produção, importação, carregamento ou comercialização de gás natural. A mesma vedação aplica-se aos membros do Conselho de Administração e da Diretoria das transportadoras, que não poderão ser indicados pelas empresas acima nem ter acesso a informações concorrencialmente sensíveis.

obre o autor: Paulo Valois Pires é sócio do escritório Schmidt, Valois, Miranda, Ferreira & Agel Advogados. Representa clientes em projetos nos setores de petróleo e gás natural, financiamento e construção de dutos, embarcações e equipamentos offshore, M&A, infraestrutura e questões tributárias. Iniciou sua carreira em 1989 como advogado corporativo da Shell Brasil e foi sócio de um importante escritório de advocacia brasileiro, responsável pelo setor de petróleo e de gás natural.

Possui Master Business in Petroleum (COPPE), pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Mestre em Direito Internacional, pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Pós-graduado em Direito Internacional, pela Université Robert Schuman, Strasbourg, France: Certificat des Hautes Études Européennes. Graduado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

Paulo Valois é autor de diversos livros e artigos publicados por jornais e revistas de circulação nacional e internacional e recomendado por diversas publicações jurídicas internacionais.

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