Filho de um operário e de uma faxineira, Anderson Caio Santos Silva só descobriu que podia estudar gratuitamente na melhor universidade do Brasil aos 17 anos, quando começou a frequentar um cursinho popular na pequena cidade de São Roque, no interior de São Paulo. Nas escolas públicas que havia frequentado no município vizinho, Mairinque, onde morava com os pais e dois irmãos mais velhos, nunca tinha ouvido falar da USP.
Naquele momento, o garoto não fazia ideia do quanto aquela descoberta marcaria o início de uma maratona de transformações, a começar pela aprovação no curso de Ciências de Computação, em São Carlos. Dali em diante, as portas se abriram. Foram dois intercâmbios: um para estudar na The University of Western Australia, com uma bolsa estágio de pesquisa no exterior da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), e outro para a McGill University, no Canadá, por meio do extinto programa Ciência Sem Fronteiras.
Em paralelo, houve ainda dois períodos de estágio no Google, um nos Estados Unidos e outro no Canadá, prosseguindo com a conquista de uma bolsa no programa Líderes Estudar, da Fundação Estudar, em 2017, em que conseguiu ser um dos 33 selecionados entre os 84 mil candidatos. A história continua com o início e o desenvolvimento de uma carreira empreendedora na área de tecnologia, em que se tornou sócio de duas empresas e fundador da Iglu, uma startup com soluções para lojas que desejam integrar suas plataformas de comércio virtuais e físicas.
Aos 28 anos, a extensa maratona de conquistas e aprendizados percorrida por esse ex-aluno do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, em São Carlos, impressiona. Não por acaso, na última semana de 2022, Anderson Silva entrou para a lista Forbes Under 30 Brasil, reconhecido como um dos 90 jovens mais brilhantes, de até 30 anos, que se destacaram em 15 ramos de atuação.
Selecionado como um dos seis destaques da categoria Varejo & E-commerce, o ex-aluno visitou o ICMC dia 2 de janeiro para contar a novidade à professora que o acompanha desde os passos iniciais dessa maratona: Solange Rezende. Era março de 2012 quando Anderson bateu na porta da sala da professora pela primeira vez. Naquela época, Solange havia submetido um projeto de pesquisa para um programa de tutoria criado pela Fuvest. A iniciativa selecionava estudantes como Anderson, que haviam sido aprovados no vestibular e possuíam situação socioeconômica desfavorável. A bolsa de tutoria foi o primeiro auxílio que Anderson recebeu na Universidade e o possibilitou prosseguir os estudos.
Desde março de 2012, o garoto nunca mais parou de bater na porta da sala de Solange, quer fosse para buscar apoio nos momentos de tomar decisões importantes ou para compartilhar frustrações e vitórias. "Ele sempre teve muita clareza sobre o que queria. Isso ajudou muito nesse processo de conseguir as coisas. Porque quando a oportunidade aparecia, ele tinha clareza de que a queria", conta a professora.
"Foi muito marcante quando meu pai e minha mãe chegaram aqui no Instituto: caramba, esse lugar existe mesmo, é gratuito! Olha esse prédio... Porque parece que é tudo pago. Isso aconteceu com os meus pais, mas também depois, quando eu trouxe um sócio do Rio de Janeiro", revela Anderson. Para ele, o ICMC é uma via expressa para oportunidades: "É difícil pensar assim, mas se eu não tivesse feito uma das coisas relevantes que fiz, será que teria dado certo? Para entrar no Google, foi relevante ter uma boa performance acadêmica, feito pesquisa e participado de maratonas de programação. Igualmente no caso da Fundação Estudar, se fosse só performance acadêmica e não tivesse o Google, provavelmente não teria entrado. Mas quem abriu as portas para o Google foi o ICMC".
As vivências durante o tempo da graduação propiciaram ao garoto que se desenvolvesse não apenas como cientista de computação, por meio dos incontáveis conhecimentos técnicos adquiridos, mas também pessoalmente e culturalmente. "Tive a oportunidade de viver aqui com jovens de todo o Brasil. Depois, abriu-se a oportunidade de ir para fora, conviver com pessoas de outras nacionalidades. Então, culturalmente e pessoalmente, foi onde eu me formei."
É sempre uma maratona – Na visita ao ICMC, Anderson percorreu alguns lugares emblemáticos de sua trajetória. Nas carteiras em que costumava estudar horas a fio, em frente a uma das grandes lousas que permeiam o Instituto, ele disse a marcante frase que registrei à giz: "É sempre uma maratona".
Entre os muitos significados que moram nessas palavras, um deles é bastante literal: nos tempos de graduação, Anderson fez parte do Grupo de Estudos para a Maratona de Programação (GEMA). Foi essa experiência de participar de um grupo de extensão que o preparou para enfrentar diversos desafios e competições de programação, um verdadeiro campo de treinamento que o levou, posteriormente, a ser aprovado nos processos seletivos do Google.
Caminhando pelo campus da USP, em São Carlos, Anderson fez questão de visitar o bloco A do alojamento estudantil. Antes de subir a escada e andar pelo corredor que dá acesso aos quartos do primeiro andar, onde viveu durante os primeiros seis meses da graduação, ele passou pelos armários no térreo. Foi ali que ele encontrou o colchão sobre o qual dormiu naquele tempo. Como só foi chamado na quinta chamada da Fuvest, quando Anderson chegou ao campus, em março de 2012, não havia mais lugar disponível no alojamento. O jeito foi se arranjar como hóspede em um dos quartos, colocando o colchão no chão.
Mas esse foi apenas mais um pequeno obstáculo na vida de Anderson, que estudou a vida toda em escolas públicas. Aos 14 anos, começou a trabalhar como menor aprendiz na Companhia Brasileira de Alumínio (CBA) no período da manhã. Atuava como eletricista na empresa e, à tarde, frequentava o curso técnico nessa mesma área, no Serviço Nacional de Aprendizagem (SENAI). À noite, cursava as disciplinas regulares do Ensino Médio. A principal preocupação era conseguir trabalho para garantir a sobrevivência. Ao chegar em São Carlos, não tinha sequer computador nem sabia falar inglês. Com os auxílios e bolsas que conseguiu, aos poucos, foi vencendo todos os percalços.
"Eu conquistei muitas coisas boas nesses 12 anos. É um salto muito grande se você comparar de onde eu saí, em 2011, para onde estou hoje. Considerando onde eu morava e que eu era um operário", avalia o ex-aluno. "A lista da Forbes é um reconhecimento de que valeu a pena todo o trabalho desses 12 anos".
Entre os desafios futuros de Anderson está a geração de riqueza por meio das empresas em que investe e da startup que criou. "Acho que estou cumprindo meu propósito de vida, que é trazer uma referência para as pessoas que vêm de onde eu vim: se tem gente que conseguiu, vai lá que você consegue, é possível. Isso é bastante significativo para mim. Quando eu venço, não sou apenas eu que venço, vence minha família e todas as pessoas que vêm de onde eu vim", finaliza.
Texto: Denise Casatti – Assessoria de Comunicação do ICMC/USP
Fonte: Redação TN com assessoria
Crédito da imagem: Denise Casatti
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