Internacional

Rússia teme passar por `venezuelização` com petróleo caro

BusinessWeek
08/06/2005 03:00
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Com o preço do petróleo na casa dos US$ 50 por barril, a Rússia - o segundo maior produtor de petróleo do mundo após a Arábia Saudita - está nadando em petrodólares. Neste ano, a expectativa é de que as exportações petrolíferas proporcionem ao país uma receita em torno de US$ 90 bilhões, frente aos US$ 14,5 bilhões em 1998. Com a entrada de tal volume de moeda forte, e com o preço do petróleo bem acima de sua média histórica, não deveriam os economistas estar animados em relação à economia russa? Possivelmente. Mas parece que quanto mais altos estiverem os preços do petróleo, mais intensas serão as manifestações de preocupação e desalento.
Ninguém está mais pessimista do que Andrei Illarionov, assessor econômico do presidente Vladimir Putin, que cunhou o termo "venezuelização" para descrever o destino que ele prevê para a economia russa. "Decidimos aderir ao Terceiro Mundo", disse em dezembro, após a controvertida reestatização da subsidiária petrolífera da Yukos. O crescente papel do Estado no setor petrolífero russo faz crescer o risco de mau gerenciamento da economia. Na Venezuela, o petróleo terminou por ser apelidado de "o excremento do diabo", nos anos 70, por causa da corrupção, desperdício e miopia que transformaram o país em um caso clássico de como arruinar uma economia.
Illarionov é conhecido por declarações provocadoras. Mas não está só quando adverte que, a menos que seja administrada adequadamente, a riqueza petrolífera pode fazer mais mal que bem. Economistas advertem sobre a "maldição dos recursos" - teoria de que freqüentemente a abundância de recursos naturais prejudica a expansão econômica de um país.
Uma preocupação é com que, como ocorreu com países ricos em petróleo, a Rússia desperdice a receita do petróleo com gastos públicos, arriscando-se a sofrer um aperto fiscal e econômico no momento em que os preços do petróleo caírem. Para guardar-se contra a tentação a Rússia criou um Fundo de Estabilização capaz de proteger o orçamento contra quedas nos preços do petróleo.
Entretanto, estão crescendo as pressões políticas no sentido da utilização desse - que já está em US$ 28 bilhões -, para ampliar os gastos. Segundo o plano original, as receitas tributárias sobre a venda de petróleo vendido por mais de US$ 20 por barril foram canalizadas para o Fundo, mas em abril o Gabinete decidiu elevar esse limiar para US$ 27, liberando US$ 10 bilhões a mais para o orçamento do ano. "Isso pode parecer baixo, mas quando olhamos para trás não é nada fácil encontrar anos nos quais o preço do petróleo tenha registrado média acima de US$ 27", diz William Tompson, da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
A mudança da política em relação ao Fundo de Estabilização é o mais recente sinal de que os defensores de rigorosa disciplina fiscal, tendo à frente o ministro das Finanças Alexei Kudrin, estão perdendo terreno para o premiê Mikhail Fradkov e outros paladinos de políticas mais populistas. Em janeiro, Moscou foi obrigada a aumentar as pensões e outros desembolsos sociais num total de US$ 7 bilhões - 1% do PIB - para adoçar a pílula amarga de reformas nos benefícios sociais que foram concebidas para substituir benefícios em espécie por pagamentos em dinheiro. As mudanças deflagraram protestos em massa.
É verdade que as finanças públicas russas parecem saudáveis e o preço do petróleo firme, que o risco de elevação de mais gastos parecem administráveis. Em 2004, a Rússia teve superávit fiscal de 4,1% do PIB; o governo prevê superávit de 1,5% este ano. Muito depende, porém, do preço do petróleo, que é imprevisível. E os riscos para a Rússia não terminam com a possibilidade de que os preços possam cair.
A política fiscal mais frouxa alimentará a inflação, que já exibe sinais de elevação. No primeiro trimestre de 2005, o IPC subiu 5,3% frente ao trimestre anterior, ameaçando a meta oficial de baixar a inflação anual de 11,7% em 2004 para 8,5% em 2005. Uma valorização da moeda torna também os fabricantes locais não competitivos.
Mais graves são os efeitos perniciosos, no longo prazo, da abundância petrolífera sobre as instituições sociais do país e sobre sua estabilidade política. Recursos naturais geram "rendas", dinheiro fácil que alimenta corrupção e interferência do Estado na economia, e desencadeia conflitos políticos entre grupos de interesse rivais.
A Rússia parece não ser exceção. A mais grave crise recente - a repressão do Estado sobre a Yukos -, revela os problemas que podem surgir quando facções rivais brigam pelo controle sobre as receitas petrolíferas. O caso Yukos e o aumento das taxas sobre as petrolíferas, desestimularam executivos da indústria petrolífera de novos investimentos. Essa é a principal razão pela qual o crescimento econômico russo está mais lento, dizem economistas, a despeito de os preços do petróleo terem subido.
Assim sendo, estará a Rússia fadada a repetir a experiência da Venezuela? O veredicto não foi pronunciado. Segundo a experiência histórica, as chances de enfrentar com sucesso a maldição são maiores em países com instituições políticas e cívicas bem desenvolvidas, como Noruega ou Canadá. Um judiciário independente, imprensa livre e partidos políticos ativos funcionam como freios contra corrupção e abuso de poder que resultam na dilapidação de riquezas. A má notícia é que a Rússia tem notas ruins em todas essas matérias.

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