Valor Econômico
Dilma Rousseff, da Casa Civil: comissão presidida pela ministra formulará propostas até o fim de novembro e Lula escolherá o modelo em dezembro ou janeiro
O governo vai empurrar, para depois das eleições municipais, a definição das regras de exploração das recentes descobertas de petróleo na camada pré-sal. A idéia de criação de uma nova estatal, voltada apenas para a administração das novas reservas, está tomando forma, embora ainda não haja uma decisão sobre o assunto. A proposta de fazer da Petrobras essa estatal tem forte rejeição dentro do governo e deve ser descartada.
Preocupados com a possível criação de uma nova estatal, dirigentes da Petrobras sugeriram ao governo que a União aumente sua participação no capital total da empresa, de forma a diminuir a presença de acionistas privados. Na atual configuração, o governo detém 55% das ações ordinárias (com direito a voto), o que lhe dá o direito de presidir o conselho de administração e ditar os rumos da estatal.
Quando se considera o capital total da Petrobras -incluídas as ações preferenciais, sem direito a voto -, a participação da União cai para perto de 32%. O restante pertence a investidores privados no Brasil - entre eles, milhares de cotistas do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) - e no exterior, principalmente, Estados Unidos e na Europa. Por causa dessa participação privada no capital da Petrobras, iniciou-se no governo um debate sobre o papel da empresa na propriedade das futuras reservas de petróleo do pré-sal.
A legislação em vigor já define que essas essas reservas, com exceção dos lotes já leiloados, pertencem à União. A proposta da Petrobras é que o governo use esse patrimônio para aumentar o capital da estatal, elevando a participação da União para algo entre 80% e 90%. Com isso, garantiria quase que integralmente ao Estado brasileiro os lucros da exploração futura do pré-sal.
O governo rejeita essa proposta. "Para a Petrobras, essa é a melhor hipótese", comenta um ministro. "O problema é que, mal ou bem, você está transferindo um patrimônio que é da União para uma empresa que é privada, mesmo que sob controle da União. Isso daria um poder monumental à Petrobras. O pré-sal deixa de ser da União e passa a ser da Petrobras. Quem controla a União é eleito pelo povo brasileiro, mas quem controla a Petrobras?", indaga o mesmo ministro.
No modelo de criação de uma nova estatal, a idéia é inspirar-se no sistema da Noruega. Naquele país, o governo possui duas estatais no setor petrolífero. Uma é a Statoil, que, a exemplo da Petrobras, explora petróleo e, igualmente, é controlada pelo governo, mas tem uma fatia de seu capital (30%) nas mãos de investidores privados. A outra é a Petoro, empresa que apenas administra as reservas de petróleo da Noruega, ou seja, não explora, portanto, não concorre diretamente com a outra estatal.
A administradora define onde quer explorar petróleo e, a partir daí, faz licitações para contratar empresas que realizam a prospecção. No edital, estabelece como a companhia exploradora é remunerada, se por meio de participação ou partilha. "O petróleo do pré-sal não será das empresas, será da estatal, que poderá fazer um contrato de partilha", explica um ministro.
Assessores graduados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva acreditam que esse modelo não prejudica a Petrobras. "Seja qual for o modelo adotado, nenhuma outra empresa no mundo tem o conhecimento do pré-sal e a experiência da Petrobras. Ela tem uma vantagem comparativa absurda, tanto que, quem for investir, vai fazer isso junto com ela", sustenta uma fonte. Técnicos lembram que a Petrobras já é detentora de aproximadamente 18% do petróleo da camada pré-sal descoberta.
As regras de exploração para os leilões já realizados não mudarão, por isso, o governo suspendeu a realização de novas licitações de campos de petróleo, uma vez que as reservas brasileiras do produto podem passar, com as descobertas das novas áreas, dos atuais 13,9 bilhões para mais de 300 bilhões de barris. "Os recursos do pré-sal nunca foram da Petrobras, sempre foram da União", disse ontem o presidente Lula, segundo relato de um assessor, em resposta à crítica de que a criação de uma nova estatal prejudicará a Petrobras.
O governo teria uma motivação estratégica para mudar a Lei do Petróleo. No modelo atual, as empresas detentoras de licenças para explorar petróleo são donas do que descobrirem, pagando ao Estado impostos, participações especiais e royalties. Por essa razão, cabe às empresas definir, por exemplo, se querem exportar óleo bruto, em vez de investir na produção de derivados.
Sendo o Estado o proprietário do petróleo, o governo, argumenta uma fonte, investirá mais na agregação de valor do produto. O plano é desenvolver no Brasil toda a cadeia produtiva do petróleo e de seus derivados, bem como a dos fabricantes de máquinas e equipamentos voltados a essa indústria.
A comissão criada pelo Palácio do Planalto para debater as futuras regras do pré-sal tem prazo até meados de setembro para concluir seu trabalho, mas, segundo um ministro ouvido pelo Valor, esse prazo será estendido. O governo não quer anunciar suas decisões antes do fim das eleições municipais, em novembro. A tendência é que a comissão, presidida pela ministra-chefa da Casa Civil, Dilma Rousseff , formule suas propostas até o fim de novembro e, em dezembro ou janeiro, o presidente Lula escolha o modelo.
O presidente quer aprovar mudanças na Lei do Petróleo no próximo ano legislativo, o último antes da eleição presidencial de 2010. "O governo evidentemente quer decidir essa questão neste governo. Não quer deixar para o próximo", conta um assessor direto de Lula.
O governo já definiu que os recursos arrecadados com o pré-sal serão destinados principalmente a investimentos em educação e ciência e tecnologia. Quer evitar também a transformação do Brasil, nas palavras de um ministro, "numa Arábia Saudita ou numa Venezuela". "A chamada maldição do petróleo, em que os países que têm petróleo são de pouca industrialização, não nos afetará. O Brasil será sem dúvida um país capaz de transformar essa riqueza em um grande benefício para sua população", disse ontem a ministra Dilma Rousseff durante a cerimônia de sorteio dos municípios, beneficiários do PAC, que serão fiscalizados.
"Temos uma indústria diversificada e um processo em andamento de industrialização da economia brasileira que pode vir a permitir também um grande país na área da indústria naval, dos equipamentos e da produção de bens e materiais que serão utilizados pela indústria petroleira. E também no que se refere à indústria química e petroquímica", acrescentou.
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