Equipamentos

Petroleiras desrespeitam índice de nacionalização

Gazeta Mercantil
03/11/2008 04:56
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As petroleiras travam uma silenciosa queda-de-braço com o governo e a Agência Nacional do Petróleo (ANP). Multas, contratos descumpridos por hora e pedidos de flexibilidade nas exigências de conteúdo nacional opõem o setor privado e o órgão regulador. Algumas empresas avisaram à agência que não estão conseguindo adquirir bens e serviços da indústria local na medida que estabelecem os contratos de concessão de áreas exploratórias. Outro problema é falta de certificação de produtos nacionais, nova exigência que afeta quase praticamente toda a indústria de petróleo e gás. “Quando assinamos os contratos de concessão da quinta rodada, em 2004, era factível atingir 51% de conteúdo local na perfuração porque o cenário era bem diferente”, afirmou o diretor da Anardarko, Claúdio de Araújo. De lá para cá, lembrou o executivo, o preço de afretamento das sondas de perfuração para áreas marítimas, importadas, disparou cerca de 300%.

 


Alugar uma sonda importada para perfurar poços em mar pode custar de US$ 300 mil a US$ 1 milhão por dia. Com isso, o peso dos equipamentos importados nos investimentos das empresas dispararam, o que tem, segundo algumas, inviabilizado o cumprimento do conteúdo nacional mínimo. O custo com perfuração passou a consumir cerca de metade dos investimentos necessários à exploração de um bloco em mar, em média. As americanas Devon, Newfield, a dinamarquesa Maersk e a Petrobras se comprometeram com índices de nacionalização tão ou mais elevados que o da Anadarko em blocos marítimos que atualmente estão em fase final de exploração ou venceram recentemente, segundo levantamento da Gazeta Mercantil.

 


A ANP ainda não multou nenhuma empresa e indica que vai dar mais tempo para que a indústria consiga cumprir os índices. Mas, se ainda assim as companhias não executarem os contratos, a reguladora aplicará a penalidade. As empresas foram estimuladas a prometer elevados índices de nacionalização a partir de 2003. Até 2002, o conteúdo nacional para esta atividade não passava de 30%. Até que o governo resolveu estimular a indústria local por meio dos leilões e da construção de plataformas e navios.

 

As regras mudaram e quem ofereceu elevados índices de nacionalização na exploração e desenvolvimento das reservas na quinta e na sexta rodadas, em 2003 e 2004, teve mais chance de vencer a disputa pelas concessões. O peso do conteúdo nacional cresceu nas propostas. Os prazos de exploração destas concessões começaram a vencer e algumas empresas não estão alcançando o que foi definido nos contratos. “Algumas concessionárias trouxeram à ANP o impacto do incremento dos custos de sonda de perfuração sobre o conteúdo local. A questão está sendo avaliada. É preciso ressaltar que essa dificuldade pode ser compensada com outras atividades, de forma a atingir o conteúdo local contratual, para as concessões resultantes das primeiras rodadas”, afirmou o coordenador de conteúdo local da ANP, José Carlos Frederice.

 


A Anadarko relata que está tentando compensar o baixo índice de nacionalização na perfuração com a contratação de brasileiros na manutenção e tripulação das atividades. De acordo com os contratos da sexta rodada, o consórcio liderado pela Devon para exploração na Bacia de Campos firmou compromisso de atingir 51% de nacionalização da perfuração dos blocos C-M-101 e C-M-61. O prazo para explorá-los termina em novembro. A empresa relata que não precisou conversar com a reguladora sobre o tema.

 

De acordo com informações da ANP, a Petrobras se comprometeu com 65% de nacionalização na perfuração de poços de blocos na Bacia de Barreirinhas, no Maranhão. O prazo para explorar as áreas vencem em novembro. Nos mais de dez blocos em Campos e Santos, de águas mais profundas, o conteúdo local prometido para a atividade é de 50%.

 

Na Foz do Amazonas, os contratos da Petrobras estampam um mínimo de 80% e o prazo vence em 2009. Procurada pela reportagem, a Petrobras informou que não vai comentar o assunto. O diretor-geral da Maersk no Brasil, Jorg Pegaht, afirmou que a empresa não possui mais blocos da quinta e sexta rodada, que teriam sido devolvidos. Ele está mais preocupado com as exigências mais recentes, que incluem o estabelecimento de conteúdo local para cada item, cada equipamento.

 

O executivo tem preocupação com blocos nas bacias de Santos e Campos que foram adquiridos recentemente. “Temos que alcançar mais 60% em alguns itens que até então precisavam de 25%”. Destaca que outras empresas se comprometeram com índices de 80%, 100%, em atividades “impossíveis” de se alcançar tanto. “Algumas empresas estão se comprometendo com índices que não vão alcançar”, disse.

 

O problema do cumprimento de conteúdo é o começo da batalha entre empresas e governo. Além disso, dezenas de empresas não estão conseguindo certificados exigidos a partir de 2006. As primeiras áreas licitadas com novas regras de certificação, também começam a ter prazos vencendo agora. “Temos defendido que a exigência de conteúdo local não pode ser aplicada na fase de exploração de áreas. O governo tem que fazer alguma coisa; não tem cabimento”, diz Wagner Freire, presidente da Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Petróleo e Gás (ABPIP).

 


A brasileira Petrosynergy vive as duas faces da questão da nacionalização de equipamentos. A empresa explora petróleo e também fornece serviços de exploração. Possui cinco sondas para áreas terrestres. O presidente da empresa, Zacharia Korn, afirmou que o índice de nacionalização médio da empresa é da ordem de 95%. Mas sem empresas aptas a conceder os certificados, a Petrosynergy, como outras, não estão conseguindo cumprir o que foi estabelecido junto à ANP. “Para certificarmos conteúdo nacional precisamos de certificadoras, mas não há empresas ainda que saibam como fazer isso”, contou.

 

Korn explicou que já solicitou propostas de certificação para cinco empresas, mas apenas uma soube mensurar o custo do serviço. “Estas empresas estão precisando de orientação do governo”. A Petrosynergy possui dezenas de blocos terrestres nas bacias do Recôncavo Baiano, Potiguar, no Rio Grande do Norte, entre outras. “Sofremos dos dois lados. Precisamos tanto de certificado para nossas atividades de exploração como para serviços que oferecemos às outras empresas.”

 

A Aurizônia, companhia independente de petróleo que atua em áreas terrestres, também reclama dos elevados índices de nacionalização. “Teremos problemas. Há índices impossíveis de serem cumpridos, como os de 90% no afretamento de sondas”, afirmou Oswaldo Pedroza. A disponilibilidade de sondas terrestres no Brasil é razoável, mas as empresas reclamam do custo do transporte, que muitas vezes supera o valor do aluguel. “A Petrobras pode pagar estes custos para incentivar a indústria nacional, até entendemos que funcione assim, mas nós não temos as mesmas condições da Petrobras”, comentou o executivo da Aurizônia. A maioria das grandes companhias e até mesmo os representantes da indústria do petróleo e dos fornecedores preferem silenciar sobre a questão do conteúdo nacional. Assim como a Petrobras, empresas maiores como Repsol e BG também informaram que não vão comentar o assunto. A Exxon Mobil não retornou a esta reportagem até o fechamento da edição, bem como a Shell. Os fornecedores nacionais representados pela Organização Nacional da Indústria do Petróleo (Onip) também foram procurados, mas a organização não se pronunciou. Também não se manifestou o Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP). Para contornar o problema da indisponibilidade de equipamentos e também fomentar a indústria local, a Petrobras lançou um programa de encomendas de sondas. A idéia é incentivar produtores locais. Mas o mercado estima que pelo menos quatro anos serão necessários para que o projeto saia do papel e o País comece a produzi-las.

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